sexta-feira, 28 de junho de 2013

Constituintes deram primeiro passo para transformações políticas em outros países

Por  João Novaes da Redação do Opera Mundi


Equador, Bolívia e Islândia mudaram suas estruturas políticas com participação popular direta
    
A proposta feita pela presidente Dilma Rousseff nesta segunda-feira (24/06) de convocar um plebiscito para autorizar uma Constituinte exclusiva sobre a reforma política foi recebida com surpresa e críticas pelo meio jurídico brasileiro. No entanto, o dispositivo da Assembleia Constituinte, que remonta à formação de um organismo colegiado para reformar ou refazer do zero uma Constituição, serviu de primeiro passo para a realização de transformações relevantes em três países nos últimos anos.

Na América do Sul, ela se tornou um dos recursos para os governos do Equador e da Bolívia transformarem suas estruturas políticas. As duas iniciativas tinham inspiração na Constituição Bolivariana da Venezuela, de 1999 e, em ambas as ocasiões, a população pôde participar do processo para escolher os membros da assembleia e, em seguida, aprovar o texto final formulado por seus integrantes. A diferença para o caso brasileiro é que este pretende utilizar a Assembleia para tratar de um tema exclusivo, embora amplo, como a reforma política – e os processos de participação popular ainda não estão definidos.

Expansão de direitos

Wikicommons
Wiphala, bandeira de muitos povos indígenas, passou
a ser considerada símbolo do Estado na
Constituição de 2009.
A Bolívia precisou de quase três anos para completar todo o processo, desde a convocação para a formação da Assembleia até a entrada em vigor da nova Carta Magna. Foi iniciativa do governo do presidente Evo Morales que pretendia, entre outras mudanças, dar mais garantias às populações nativas do país e ter meios para implantar uma agenda mais progressista.

Em 2 de julho de 2006, ocorreu a primeira etapa, que elegeu os membros da Assembleia Constituinte, com pouco mais da maioria simples favorável ao partido Movimento ao Socialismo, do presidente Evo Morales. Mas para o texto ser aprovado pela assembleia eram necessários dois terços (66%) dos votos. Foi necessário um acordo político com a oposição para a aprovação do texto a ser levado a referendo popular.

Após ter sido postergado por duas ocasiões pela justiça local, o referendo constitucional foi realizado em 7 de dezembro de 2008 e aprovada com 61,43% dos votos.

A nova Constituição boliviana entrou em vigor em 7 de fevereiro de 2009 (três meses após a aprovação popular) e previa, como principal mudança, o fortalecimento da população indígena, que passava a ter uma representação mínima garantida por quotas no Congresso; além de uma ordenação jurídica voltada às necessidades dessa parcela da população que vive no campo; o direito à autonomia e ao autogoverno e terras; e o direito à propriedade dos recursos naturais de suas comunidades.

Entre outras ações, o país também passou a pleitear como direito irrevogável uma saída para o Oceano Pacífico; proibiu o latifúndio (o limite de terras para cultivos foi decido diretamente no referendo);  passou a privilegiar investimentos na economia nacional em relação à estrangeira; tirou do catolicismo a posição de religião oficial; passou a considerar o cultivo de coca como patrimônio cultural; introduziu outras 36 línguas indígenas como idioma oficial ao lado do espanhol; e colocou a exploração de seus recursos naturais sob responsabilidade do Estado.

Também possibilitou que Morales pudesse concorrer à uma segunda reeleição, já que seu primeiro mandato contemplava a Constituição anterior. Outra alteração importante foi que o Estado passava se constituir como plurinacional, ou seja, plural, unitário, soberano, democrático e multicultural.

Revolução Cidadã

No Equador, o presidente Rafael Correa, em seu primeiro ano de mandato, em 2007, cumpriu sua principal promessa de campanha e convocou a população para um referendo que, por sua vez, decidiu favoravelmente pela criação de uma Assembleia Constituinte, encarregada de formular uma nova Constituição para o país.

Na primeira etapa, a população concordou com a realização de uma Assembleia, que acabou sendo aprovada por 81,72% dos votos em 15 de abril de 2007.

Em 30 de setembro, com nova eleição popular, de daquele ano foram escolhidos os 130 representantes que redigiram a nova Carta Magna do país, base para a “Revolução Cidadã”, principal marca do governo de Correa. As votações foram transmitidas ao vivo e, durante alguns meses, o órgão assumiu os poderes legislativos do Congresso até que a nova carta fosse submetida a referendo.

Duas disposições importantes, como o casamento entre pessoas do mesmo sexo e um artigo que colocava o quéchua como um dos idiomas oficiais, foram tirados na última hora, e o texto a ser apresentado à população conseguiu ser aprovado por 94 congressistas.

O texto foi submetido a votação popular em 28 de setembro de 2008 e aprovado por 63,93% dos votos.

Wikimedia Commons
Convocação para a votação do referendo constitucional
equatoriano em Londres
Entre as disposições mais importantes, o texto permitiu a possibilidade de Correa se reeleger por mais dois períodos eleitorais consecutivos; permitiu que o país estipulasse uma moratória da dívida pública; ampliou o papel do Estado em setores estratégicos da economia, como mineração, petróleo e agropecuária; concedeu uma ampla margem de manobra para o país renegociar contratos de petróleo; descriminalizou o consumo de drogas; e registrou avanços nos conceitos de soberania alimentar e nas uniões entre pessoas do mesmo sexo (embora ainda exclua o conceito de casamento).

Foi também a primeira Constituição no mundo a reconhecer os direitos da Natureza, como os artigos 71 a 74 que proíbem a extração de bens não renováveis em áreas protegidas. Os latifúndios ficaram proibidos para permitirem o reflorestamento e a reabilitação do solo.

Participação popular

Fora do contexto sul-americano, chama a atenção o caso da Islândia, que inovou ao abrir uma nova alternativa à participação popular. O arquipélago escandinavo foi, em 2008, o primeiro país afetado pela crise das dívidas soberanas europeias, quando seus vencimentos representavam 900% do PIB e a moeda nacional desvalorizou 80% em relação ao euro.

Em profunda recessão, com uma diminuição do PIB em 11% em dois anos, o governo conservador quis aplicar as medidas de austeridade exigidas pelo FMI em troca de um aporte financeiro de 2,1 bilhões de euros em 2009. Entretanto, uma forte mobilização popular obrigou o premiê a renunciar.

Um novo governo, de base progressista, apoiado pela maioria popular que se recusou a contribuir para salvar bancos duas vezes em referendo, convocou uma nova Assembleia Constituinte formada por 25 cidadãos eleitos por sufrágio universal em 16 de junho de 2010.

A novidade foi que, através de diversas redes sociais, os islandeses puderam acompanhar o andamento dos trabalhos e também participar efetivamente deles. O objetivo da medida foi fazer com que as mudanças contassem efetivamente com a participação da população. O governo autorizou a criação de uma página no Facebook para que internautas sugerissem mudanças, além de também contemplar o processo via Twitter, YouTube e Flickr.

Wikimedia Commons
Cerca de seis mil pessoas protestaram em frente
ao Parlamento islandês contra a salvação dos
bancos, em novembro de 2008.
A assembleia tinha um site oficial em islandês e em inglês sobre o projeto de reforma. Nela, os cidadãos podiam ler os comentários postados nas redes e, todas as quintas-feiras, era realizado um debate transmitido ao vivo com todos os temas e sugestões.

Uma nova Constituição, redigida pelos constituintes e composta por nove capítulos e 114 artigos, foi aprovada em 20 de outubro de 2012. Ela prevê o direito à informação, com acesso público aos documentos oficiais (artigo 15), a criação de uma Comissão de Controle da Responsabilidade do Governo (artigo 63), o direito à consulta direta (artigo 65) – ou seja, 10% dos eleitores podem pedir um referendo sobre as leis votadas pelo Parlamento –, assim como a nomeação do primeiro-ministro pelo Parlamento. Assim como os países sul-americanos, também passou a considerar os recursos naturais como patrimônio natural, sem direito à propriedade privada.

FONTE: Opera Mundi

sexta-feira, 21 de junho de 2013

Brasil em convulsão: politizar as manifestações e unir a vanguarda

Por Milton Pinheiro (*)  



O dia 17 de junho será registrado na história como aquele da redescoberta das ruas por segmentos expressivos da juventude e dos trabalhadores. A crescente indignação da população não é tão somente com o aumento da tarifa dos transportes em várias partes do Brasil. Trata-se da implosão de um ciclo de esgarçamento social levado às últimas consequências pelo aparato de Estado da burguesia, na tentativa de regular a vida social através do mercado, remunerando o capital em sua crise sistêmica.

A movimentação da juventude e dos trabalhadores, atacados por esse ciclo, tem gerado um caldo de cultura que pode contribuir, se politizado e unificado no campo da vanguarda, para movimentar o bloco contra-hegemônico a partir dessas demandas que estão vindo à cena política em virtude da espoliação social que se consolidou com a imensa retirada dos direitos sociais. Além das questões imediatas que dizem respeito às condições de vida dos trabalhadores, estas manifestações trazem à tona a indignação por parte de setores populares importantes diante dos descalabros com inversões de prioridades dos governos em seus mais diversos níveis neste momento de crise.

As ruas foram tomadas nas principais capitais do país: uma parte significativa da juventude brasileira está estreando na dinâmica do protesto, as forças políticas ainda estão surpresas com o volume das manifestações, uma parcela importante da juventude – ainda pautada pela influência da ideologia burguesa – questiona a presença da vanguarda política (partidos), não sabendo ela que grande parte das palavras de ordem que tem movimentado, e animado, as manifestações tem origem na história de luta e resistência dessa vanguarda.

Uma etapa dessa luta foi vencida, ela não é apenas por questões que digam respeito ao valor da tarifa dos transportes. A luta, agora, é por bandeiras políticas que suspendam a zona de conforto do bloco no poder.

Precisamos entender que o cenário de convulsão social está criando uma nova pauta para o operador político. Essa pauta é clássica, na visão do marxismo, na medida em que, para entendê-la, é necessário utilizar o instrumento de análise concreta da realidade concreta.

A convulsão social se apresentou no fogo da conjuntura e está inspirando uma luta de novo tipo: trazendo trabalhadores para as ruas, avenidas, portas de palácios e parlamentos. Sugerindo ao operador político, enquanto organizador coletivo, a construção da unidade contra-hegemônica no campo da esquerda revolucionária com toda a sua diversidade política; conclamando para essa luta, sem hegemonismos, os sujeitos históricos que poderão desafiar a ordem e impactar o difuso campo popular neste momento essencial da luta de classes, quando setores orgânicos à classe estão em ebulição.

O momento é extraordinário para impedir que os passos que foram construídos pelo caldo de cultura da barbárie social, alimentada pela burguesia monopolista, avancem. Precisamos na correlação de forças que nos é favorável frear a xenofobia, o chauvinismo, o reacionarismo social, enfim, a manifestação do fascismo.

A juventude insiste em permanecer nas ruas; os governos estão estupefatos e claudicam na movimentação da institucionalidade burguesa; devemos tentar, através das agências contra-hegemônicas, fazer avançar o freio de emergência da nossa classe contra o projeto do capital: temos que paralisar trens, metrôs, portos, aeroportos, levar os protestos para dentro dos estádios, interditar as rodovias, fechar os pedágios, ocupar terras, paralisar o serviço público, fomentar a possibilidade da greve geral. Todo o arcabouço da luta direta deve ser usado neste momento de convulsão social. Contudo, a vanguarda política deve ter a maior preocupação com o convívio democrático com amplas camadas da juventude e dos trabalhadores que ainda não compreendem o papel histórico que devemos ter neste momento e se colocam, ainda, no campo tão somente da indignação.

A cena política com a sua conjuntura veloz permite entender que brechas foram abertas na institucionalidade burguesa e que isso é fundamental para que possamos agir nas contradições do processo. O que está sendo decidido não é a questão do poder político que vamos ter; o que está na ordem do dia, a partir do aprendizado dessas manifestações pautadas pela convulsão social, é que é possível lutar e é possível vencer.

Essa é a lição que devemos extrair neste primeiro momento de enfrentamento político e social. Mas também entender que a institucionalidade burguesa vai tentar descaracterizar a movimentação social; os meios de comunicação se comportarão, a partir daqui, com o bom mocismo da hipocrisia cívica, ou seja, fingindo apoio para impedir a movimentação política das massas.

O papel dos lutadores sociais, neste momento, é fomentar de forma mais ampla possível a politização da luta, através das demandas massacradas pelo esgarçamento social patrocinado pelo capital. Além disso, é necessário educar os lutadores neste processo de luta direta, ao tempo em que é hora de desenvolver a mais profunda unidade do campo contra-hegemônico para construir a possibilidade de movimentar o bloco revolucionário do proletariado nessas e noutras batalhas que virão na história do tempo presente.

(*) Milton Pinheiro é professor de Ciência Política da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), autor/organizador, entre outros, do livro Teoria e prática dos conselhos operários, juntamente com Luciano Cavini Martorano, no prelo (Expressão Popular, São Paulo, 2013).

FONTE: Correio da Cidadania

terça-feira, 18 de junho de 2013

Como não nos indignarmos?

Por Aluizio Moreira

Se observarmos o cotidiano da mídia brasileira, constatamos uma realidade que a maioria da população desconhece.

Verificamos que há um Brasil dos que se omitem, dos que se calam, em nome da manutenção dos seus privilégios, em nome de uma pseudo neutralidade política, ou de defesa intransigente de um ou outro partido político no poder. E há um outro Brasil : uma parcela bem significativa da população de pobres, de explorados, de desempregados, de excluídos, de sem tetos, de sem terras, de sem emprego, que parecem não existir nesse país, que não têm como se manifestar.

A crise do sistema capitalista que atingiu a curva ascendente em 2007/2008 e continua ainda sabe-se lá por quanto tempo, fez surgir uma nova forma de expressão da população que protagonizou movimentos de rebeldia e de indignação em grande número de países da Europa e Américas. Tal movimento, embora se manifeste esporadicamente aqui e ali em nosso país, não atingiu ainda as dimensões que deveria ter atingido, dadas as situações de calamidades, de impunidade, de total omissão dos poderes públicos ou políticas conscientemente adotadas a serviço dos grandes grupos, sejam eles nacionais ou estrangeiros.

Diante da grande mídia monopolizadora do noticiário nacional, surgem alternativas na imprensa virtual, nos blogs, nas redes sociais, que sem copyright, sem reservas de direitos (Jornais e revistas tornaram-se proprietários exclusivos das notícias, na contramão do art. 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos aprovada, pasmem! em dezembro de 1948), ainda divulgam e condenam as injustiças cometidas pelos reprodutores do sistema. Para Manuel Castells, Thomas Coutrot e Stephane Hessel, essas mobilizações reforçam e apontam para a um “retorno às fontes da democracia [que] significa a intervenção do povo” (Thomas Coutrot). Como necessidade do resgate da democracia no seu significado mais autêntico, sem o falseamento ou inversão ideológica do termo pela classe política dominante hoje.

Como cruzarmos os braços diante duplo crime (contra a natureza e contra a população local) da Hidrelétrica Belo Monte? Como ficarmos indiferentes diante do massacre ocorrido recentemente contra os indígenas da comunidade Kaiowá Guarani que culminou com o fuzilamento do cacique Nisio Gomes?

Como não protestarmos contra o Novo Código Florestal que segundo geógrafos e ecologistas só beneficiam o latifúndio e o agronegócio? Como não nos mobilizarmos contra a ausência de políticas públicas, sobretudo para os jovens afrodescentes no país? Como não nos indignarmos contra a violência policial que vitimam os estudantes em São Paulo? Como não nos revoltarmos contra a ação policial que tentam expulsar os indígenas Fulni-õ e Tuxás das terras do Santuário dos Pajés por eles ocupadas há mais de 40 anos no Distrito Federal? Como não nos levantarmos contra as impunidades que acobertam assassinatos de trabalhadores, lideres camponeses e religiosos? 

Como não nos indignarmos contra a impunidade dos parlamentares corruptos, das negociatas? Como não nos indignarmos contra o mau uso do dinheiro público, enquanto falta verbas para a educação, a saúde, a segurança, o sistema de transporte coletivo? 

Não adianta autoridades governamentais declararem em rede de televisão, que reconhecem a justeza das reivindicações do nosso povo. Sabemos que continuarão tão insensíveis e descomprometidos com as causas populares como antes.

domingo, 9 de junho de 2013

Megaprojetos na Amazônia ameaçam os povos indígenas isolados

Por Administrador

Equipe do CIMI

A equipe do Conselho Indigenista Missionário – Cimi, de apoio aos povos indígenas isolados, reunida em Manaus nos dias 4 a 7 de junho/2013 fez uma análise dos impactos dos megaprojetos de infraestrutura projetados e em construção na Amazônia sobre esses povos.

Criança Awa
Foi constatado que está em curso uma campanha contra os direitos dos povos indígenas veiculada diariamente pelos grandes meios de comunicação para respaldar os interesses dos empresários do agronegócio, latifundiários, mineradoras e a política desenvolvimentista do Governo Federal, caracterizada pelo autoritarismo, pelo uso da violência pelas forças repressivas (dois indígenas assassinados pela PF, um Munduruku/PA em novembro/2012 e outro Terena/MS em maio/2013), pelo desrespeito a Constituição, as convenções internacionais e a legislação ambiental.

Este cenário, que se materializa na Amazônia pelas obras de infraestrutura do Programa de Aceleração do Crescimento - PAC, pelo avanço do desmatamento, do gado, da exploração madeireira, mineral e petrolífera, espalha os conflitos na região e é particularmente trágico para a vida e o futuro dos povos indígenas isolados.

No Maranhão os Awá Guajá tem o seu território sistematicamente invadido por madeireiros que agem impunemente há anos, inclusive em terras indígenas já regularizadas aonde vivem estes indígenas isolados. Este fato foi recentemente denunciado a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA.

Os isolados Avá Canoeiro na Ilha do bananal Tocantins estão ameaçados pelos projetos de monocultura, que retiram água do rio Javaé e Formoso, assoreando e contaminando os rios, pelas invasões de pescadores, e pela projeção de duas estradas que cortarão a ilha ao meio.

As barragens de Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira atingem cinco grupos indígenas isolados. A existência desses grupos só foi reconhecida após terem sido concedidas as licenças de instalação das obras. Estes grupos, em busca de um habitat mais seguro, estão se aproximando de fazendas e de aldeias de outros povos indígenas podendo gerar conflitos.

Na bacia do Rio Xingu, 06 grupos indígenas isolados sofrem a influência da barragem de Belo Monte. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos, CIDH, em 29 de julho de 2011, determinou ao Estado brasileiro que adotasse medidas para a proteção da vida, a saúde e a integridade pessoal dos membros das comunidades indígenas em situação de isolamento. Após três anos, praticamente inexistem ações do governo para cumprir a solicitação.

A vida de outros 5 grupos de isolados será ameaçada caso sejam construídas as barragens, atualmente na fase de estudos, da bacia do rio Tapajós.

As empresas petrolíferas ameaçam os povos indígenas isolados no Departamento de Ucayali no lado peruano e no lado brasileiro, na terra indígena Vale do Javari no Amazonas e no Acre.  Na mesma região está em estudo a construção da ferrovia Cruzeiro do Sul-AC/Brasil – Pucalpa/Peru, cujo traçado incide diretamente sobre o território do povo indígena isolado do igarapé Tapada.

Denunciamos à sociedade brasileira que o risco a vida dos povos isolados vem aumentando nos últimos anos e tem-se agravado com a atual política do governo Dilma de imposição de um modelo macro econômico altamente agressivo e depredador.

Manaus, AM, 07 de junho de 2013.

Equipe do Cimi de apoio aos povos indígenas isolados

FONTE: CIMI - Conselho Indigenista Missionário

A repressão das classes dominantes contra os camponeses

Por José Levino

Painel "Os Retirantes"
de Cândido Portinari
Ao criar a personagem Jeca-Tatu, o genial escritor Monteiro Lobato quis denunciar a situação em que vivia o homem do campo no Brasil, abandonado à própria sorte. Mas a personagem foi interpretada com símbolo do trabalhador rural brasileiro, por sua simplicidade, ingenuidade, ignorância, desleixo, etc. Essa visão preconceituosa do camponês, disseminada pelos meios de comunicação e pela própria escola, corresponde à ideologia das classes dominantes, e atinge até setores de esquerda colonizados pela visão capitalista europeia do mundo. O grande Lenin já promoveu a devida retificação no início do século XX, deixando claro tanto na teoria como na prática da Revolução Russa, que o campesinato é aliado fundamental do proletariado urbano nos países da periferia, e que seria impossível tomar o poder político e construir o socialismo sem a consolidação de uma forte e indissolúvel aliança operário-camponesa.




Bravo como um Leão

A história do Brasil é rica em exemplos de que esse homem amável, cordial, e aparentemente acomodado à situação em que vive, se transforma num leão quando sente ameaçada sua família, o pedacinho de chão em que vive e planta, ou para conquistar o seu chão. Os latifundiários e a burguesia sabem muito bem disso, tanto que sempre reprimiram com extrema violência e crueldade as tentativas de libertação dos camponeses em todo o decorrer da nossa história, e não apenas nos períodos de ditadura.

Sem esquecer a Resistência Indígena e o hercúleo esforço dos Quilombolas, atendo-nos ao século passado, nos emocionaremos com lutas memoráveis por terra para trabalhar, viver com dignidade, todas combatidas sem dó nem piedade, resultando em milhares de mortos, sem diferença de gênero, idade ou raça. Muitas dessas lutas já foram relatadas nas páginas do jornal A Verdade nos seus onze anos de existência: Canudos, Contestado, Caldeirão, Trombas e Formoso, guerrilha do Porecatu, as Ligas Camponesas, etc.
Idosos, mulheres e crianças remanescentes da última expedição do Exército Brasileiro (depois de três vitórias em Canudos) foram impiedosamente degolados para que ninguém pudesse contar a história, cujo registro o povo brasileiro deve ao jornalista e escritor Euclides da Cunha. No Caldeirão, para pôr fim a uma pequena comunidade de camponeses desarmados em Juazeiro do Norte (CE), o governo de Vargas utilizou a Força Aérea (FAB).

Na ditadura e na “democracia”

Nos anos que antecederam ao golpe de estado de 1964, as Ligas Camponesas e os sindicatos relacionaram e denunciaram um sem-número de casos de violência praticados pelos capangas, milícias e pistoleiros de aluguel pagos pelos latifundiários, não raro com a participação de policiais. São métodos cruéis. Mergulhavam, por exemplo, a pessoa num tanque de mel e a levavam para ser lambida por vacas até o corpo ficar coberto de chagas ou a punham amarrada sobre um formigueiro. Muitas usinas e fazendas tinham um cubículo para trancar o camponês que reclamava algum direito e o deixavam por tempo indeterminado em completa escuridão, apenas com um buraquinho para tomar fôlego.

Em seu livro Que São as Ligas Camponesas? , Francisco Julião relata: “camponeses são arrastados por jipes; com um ferro em brasa, marcam-lhes o peito e as nádegas; um é posto lambuzado de mel sobre um formigueiro; outro é metido numa cuba cheia d’água, mantido noite e dia a pão seco, servindo-se daquela água contaminada por urina e fezes onde fica mergulhado até a boca; tem havido camponeses mutilados na presença de outros, sendo pedaços de sua carne oferecidos aos cães, para servir de exemplo….” . Assassinato de lideranças e chacinas coletivas também são uma constante.

O que muda com a ditadura civil-militar implantada no dia 1º de abril de 1964 é que o Estado assumiu a repressão, oficial ou extra-oficialmente, imbricando-se com a repressão privada, que de modo algum foi extinta. Os métodos de tortura adotados nos porões da ditadura não foram tão diferentes, alguns mais sofisticados e até piores, como os choques elétricos na boca e nos órgãos genitais, introdução de objetos nas vaginas e ânus dos (as) torturados (as), a tortura de crianças diante de mães ou pais, sem contar o exílio, que é o assassinato da nacionalidade.

As Ligas Camponesas, postas de imediato na ilegalidade, foram as primeiras vítimas do golpe. “…Quase todos os dirigentes foram presos ou mortos. Começaram a perseguir camponeses e assassinaram vários: enforcaram, queimaram …” (Francisco Julião, entrevista ao Pasquim, 1979). Homens, mulheres, crianças, eram presos e tangidos como animais. O líder comunista Gregório Bezerra foi torturado de forma bárbara, publicamente, pelas ruas do Recife, numa repetição da via-sacra de Jesus Cristo.

Dirigentes das ligas e dos sindicatos, ativistas de base, não importava a filiação político-ideológica: comunistas, cristãos, teve qualquer grau de militância, podais ser preso, torturado, morto, desaparecido. A Comissão Pastoral da Terra (CPT) registra o número de 1.586 assassinatos em razão da luta pela terra no período de 1964 a 1986.

O Nordeste foi a região mais visada, pois as ligas e os sindicatos eram mais fortes e combativos, mas a repressão atingiu todos os recantos do país. Do Norte ao Sul. Aliás, no Rio Grande do Sul, nascera em 1950 o Movimento dos Agricultores Sem Terra (Master), desmantelado pela ditadura (1964). Ele foi precursor do MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem terra, fundado em 1984 em Encruzilhada Natalino (RS).

A redemocratização ocorrida em 1964 não pôs fim à repressão, como se poderia pensar. Ela continua vitimando todos os que ousam desafiar a estrutura agrária e lutar por terra para quem nela trabalha. E se faz das duas formas: pelo Estado, a exemplo de Eldorado dos Carajás (1996), ou por pistoleiros, capangas e milícias privadas. Nem sequer houve redução. A tendência tem sido de crescimento. De acordo com os dados levantados pela CPT, em 2012 houve um crescimento de 24% no número de assassinatos e de 102% nas tentativas de assassinatos no campo.

Apoiadores na Mira

A repressão no campo não atinge apenas os camponeses. Mas também aqueles que os apóiam, especialmente sacerdotes e advogados. Casos mais conhecidos de assassinato: padres e freiras João Bosco Penido Burnier (Mato Grosso, 1976), Josimo Morais Tavares (Maranhão,1986), Irmã Dorothy Stang (Goiás,2005). Advogados: Djalma Raposo (Pernambuco, 1972), Gabriel Sales Pimenta (Pará, 1972), Evandro Cavalcanti da Silva (Pernambuco, 1987).

Na lei ou na marra?

O crescimento da violência das classes dominantes contra os camponeses em luta por terra é resultado da permanência do mesmo modelo agrário concentrador da propriedade da terra. Não houve avanço algum nesse sentido após o fim da ditadura, exceto algumas desapropriações pontuais que em nada abalaram o latifúndio brasileiro, hoje chamado de agronegócio. A esperança de que assumindo a Presidência da República, o PT promoveria a reforma agrária, se transformou em ilusão.

Está claro que não é com recuo da mobilização e da organização dos camponeses que se conseguirá terra para quem nela trabalha. A negociação não conseguirá jamais desmanchar o casamento desastroso, como dizia Marx, entre o senhor Capital e a senhora Terra.

As Ligas Camponesas tinham um lema: “Reforma Agrária na lei ou na marra”. O legalismo já se mostrou ineficaz. Que caminho resta? O caminho da luta é, pois, inevitável.

FONTE: Jornal A VERDADE

sábado, 1 de junho de 2013

"FOLHA DO POVO"

O 1º de maio passado foi marcado por um acontecimento bastante significativo para o PCB pernambucano e especialmente para os trabalhadores em geral, em razão do ressurgimento do Jornal “Folha do Povo”, que durante décadas de circulação (a partir de 1935), esteve sempre à frente das lutas em defesa dos explorados e oprimidos, e pela construção de uma sociedade socialista. 

Esperamos que desde vez, “Folha do Povo” tenha vida longa, podendo cumprir o papel que sempre procurou desempenhar junto à sociedade: abrir espaço para discussão, informação, formação de uma consciência critica diante dos fatos colocados pela própria sociedade, mas que acima de tudo possa colaborar para a organização da sociedade civil no processo de construção de um mundo novo. 

Fazem parte do seu Conselho Editorial: Nagib Jorge Neto, Roberto Arrais, Jodeval Duarte, Michel Zaidan Filho, Antonio Alves, Délio Mendes, Dionizio Valois, Danúbio Aguiar, Antonio Henrique, Diego Rafael, Anibal Valença, Odon Porto e Alcides Campelo Jr.

Abaixo transcrevemos o Editorial que marca o ressurgimento da “Folha do Povo”
(Mundo do socialismo) 
  

Editorial

A Folha do Povo ressurge nas lutas de 1º de Maio

A Folha do Povo, jornal do PCB em Pernambuco fazia parte de uma rede de comunicação dos comunistas brasileiros até o seu fechamento pelo golpe que instalou a ditadura civil-militar. Estes comunistas hoje mantêm, em nível nacional, presença nas redes sociais, na internet e através do seu jornal nacional, o “Imprensa Popular.”

O PCB de Pernambuco resolveu voltar a ter o seu jornal e escolheu resgatar o mesmo nome, Folha do Povo, pela sua histórica presença nas lutas dos comunistas e dos trabalhadores do campo e da cidade, desde sua fundação em julho de 1935 até o fechamento em 1964, quando passara a circular com o título de “A Hora”.

O seu primeiro chefe de redação, o escritor e jornalista Rubem Braga, diria, anos mais tarde, que a “Folha do Povo era o jornal mais quebrado do mundo”, se referindo ao processo de repressão, empastelamento e violência que se abatiam, quase sempre, contra o jornal e os colaboradores, muito deles militantes históricos da causa revolucionária e socialista, entre eles, o Rubem Braga, Sindulfo Josué, Ivo Valença, David Capistrano, Adalgisa Cavalcanti, Júlia Santiago, Hiran Pereira e tantas outras figuras de lutadores que fizeram história em nosso Estado e País.

A Folha do Povo se apresenta como uma trincheira de lutas e debates para questionar e discutir criticamente o modelo de desenvolvimento de Pernambuco e do Brasil, que privilegia os grandes grupos econômicos nacionais e internacionais, deixando para os trabalhadores asa migalhas, as  políticas compensatórias para fazer diminuir a miséria, ampliando a precarização do trabalho, a perda dos direitos previdenciários, usurpando os direitos a uma  aposentadoria digna, destruindo de forma avassaladora os recursos naturais, tornando insuportáveis as condições de urbanidade e de vida nas cidades.

A Folha do Povo se coloca como um canal de comunicação, discussão, formação e informação aos militantes do Partido Comunista Brasileiro (PCB), e, aos trabalhadores e trabalhadoras, estudantes, artistas, intelectuais e à população em geral.

Decidiu-se relançar a Folha do Povo no dia Internacional dos Trabalhadores, no 1º de Maio, como contraponto ao que é hoje comemorado no Brasil com festas e sorteios, vergonhosamente promovidos pela maioria das organizações e centrais sindicais, com o beneplácito do Estado e de grandes empresários.

Por isso a Folha do Povo cumpre um importante papel político com visão de classe, ao lembrar o significado verdadeiro do 1º de Maio, que é o de confraternização e de impulso à luta internacionalista dos trabalhadores do mundo. Este é um dia para reverenciar os mártires e heróis e todos os que lutam por uma nova sociedade sem a exploração do homem pelo homem.

Aqui lembramos as palavras de um dos mártires de Chicago, August Spies, um dos líderes enforcados, acusado de liderar o movimento das lutas operárias pela jornada de oito horas e por melhores condições de vida e de salários, em 1886, que disse: “Aqui terão apagado uma faísca, mas lá e acolá, atrás e na frente de vocês, em todas as partes, as chamas crescerão.”

A Folha do Povo ressurge como uma faísca da indignação diante da exploração do capital contra a maioria dos trabalhadores, como um instrumento que faça que a chama do novo mundo se espalhe pelas fábricas, pelos campos, pelas cidades, pelas consciências dos jovens, das mulheres, dos oprimidos  explorados, que se amplie na luta contra o imperialismo, contra o capitalismo, contra o latifúndio e que se aprofunde na luta pela paz e pelo socialismo. A Folha do Povo é instrumento para divulgar e se alcançar a insígnia de: “Proletários de todo o mundo, uni-vos!” (Karl Marx).