sábado, 24 de setembro de 2016

A Produção Político-Cultural do PCB dos anos 30 aos 60



Por Ricardo Costa*


O aparato político-cultural do PCB funcionou, ao longo de sua história, como importante polo gravitacional do mundo da cultura, com um grau de adesão mais ou menos permanente, a depender sempre das circunstâncias políticas e dos debates internos. Para um partido que viveu a maior parte de sua história na clandestinidade, o fato de o seu aparato político-cultural ter se constituído de maneira expressiva de tempos em tempos, como em 1935, nos anos 1945/47, 1948/52 e 1963/64, comprova o peso da sua inserção no campo cultural e a capacidade de fazer circular na sociedade os bens simbólicos produzidos internamente, os quais eram difundidos, principalmente, pela imprensa partidária.

Nos primeiros anos de sua existência, o Partido Comunista teve como seus principais dirigentes os intelectuais Astrojildo Pereira e Octávio Brandão, autores de obras difusoras do pensamento marxista e das opiniões dos comunistas acerca da conjuntura nacional e internacional, além de inúmeros artigos publicados nas revistas e jornais mantidos pelo partido ou abertos à colaboração de seus militantes. A linha adotada pelo III Congresso, em favor da proletarização do partido, com a estrita subordinação às diretrizes da Internacional Comunista, promoveu a exclusão dos intelectuais da direção e sua marginalização da vida partidária. O período posterior à "Revolução de 1930" foi também acompanhado por uma forte onda repressiva do Estado contra os movimentos organizados dos trabalhadores, seguissem eles a orientação anarco-sindicalista ou a comunista. Paradoxalmente, o PCB conseguiu republicar o jornal A Classe Operária, ao mesmo tempo em que estendia sua influência a parcelas significativas das camadas médias, como estudantes, militares e intelectuais.

Os modernistas Oswald de Andrade e Patrícia Galvão (Pagu) entraram para o partido, e publicações editadas entre 1931 e 1934, tais como a revista mensal Boletim de Ariel (destinada à divulgação e discussão de livros, na qual se travaram debates sobre o socialismo soviético e a literatura proletária) e a revista de literatura, arte, economia e ciência Espírito Novo contavam com a colaboração de nomes vinculados ou próximos ao partido, como Jorge Amado, Alberto Passos Guimarães, Aderbal Jurema, Cândido Portinari, Aníbal Machado, Raquel de Queiroz, Caio Prado Júnior, Carlos Lacerda, Di Cavalcanti, Tarsila do Amaral e o já citado Oswald de Andrade, dentre outros.

O auge da influência do PCB na década em questão se deu em 1935, com a expansão das ações dos comunistas na sociedade, graças, centralmente, à sua atuação no interior da Aliança Nacional Libertadora. O partido conseguia acesso a publicações para militares, inúmeros jornais e boletins sindicais e estudantis, além de ter participação em várias revistas culturais e de manter três jornais diários (A Manhã, no Rio; A Plateia, em São Paulo e Folha do Povo, em Recife), nos quais colaboravam o humorista Aparício Torelli (o Barão de Itararé), o pedagogo Anísio Teixeira, o professor Hermes Lima, o sociólogo Arthur Ramos, o poeta Jorge de Lima, Rubem Braga, Raquel de Queiroz, José Lins do Rêgo, Oswald de Andrade, Paulo Werneck e Portinari, entre muitos outros.

A repressão desencadeada sobre o movimento de 1935 desbaratou a imprensa identificada com os comunistas, mas, em 1937, mesmo sob a ditadura do Estado Novo, era editada a Revista Problemas, de orientação nacionalista e antifascista, tratando de temas relativos a economia, política, literatura, história e reunindo diversos intelectuais de esquerda, comunistas ou não: Moacir Werneck de Castro, Flávio de Carvalho, Edison Carneiro, João Mangabeira, Procópio Ferreira, Arruda Câmara, Joel Silveira, Rubem Braga, Oswald de Andrade, etc. 

Outras publicações estiveram subordinadas à orientação do PCB, ainda durante o Estado Novo: a Revista Cultura, contando com a presença de Sérgio Milliet, Graciliano Ramos, Monteiro Lobato, além dos nomes já elencados acima; a Revista Proletária, órgão teórico de orientação marxista-leninista e de combate ideológico ao trotskismo e ao fascismo; Diretrizes; Dom Casmurro e a baiana Seiva. No plano mais cultural, destacavam-se as revistas Leitura, Esfera (com a participação de Dias da Costa, Jorge Amado, Graciliano e outros) e Continental, de caráter informativo e voltada a analisar o contexto internacional, além de pregar a linha partidária de defesa da união nacional. Era comandada pelo dirigente Armênio Guedes e tinha, como colaboradores, os também comunistas Mário Alves, Maurício Grabois, Rui Facó, Álvaro Moreyra, dentre outros.

Mas foi no período da redemocratização, a partir de 1945, que o aparato cultural dos comunistas cresceu de forma considerável, por meio de uma ampla cadeia de informação que contava com diversos semanários e oito jornais diários distribuídos propositalmente pelas principais cidades do país (Tribuna Popular, depois Imprensa Popular, no Rio; Hoje, em São Paulo; O Momento, Salvador; Tribuna Gaúcha, Porto Alegre; Folha do Povo, Recife; Jornal do Povo, João Pessoa; Folha Popular, Natal, entre muitos outros.), tendo se constituído numa das maiores redes de comunicação da época, talvez apenas suplantada pelos Diários Associados, do empresário Assis Chateaubriand. A tiragem do Tribuna Popular, por exemplo, chegou a atingir entre 30 e 50 mil exemplares nos anos de 1945 e 1946, quando a maior gazeta do Rio alcançava exatamente o número de 50 mil jornais impressos.

Era republicada, como órgão central do partido, A Classe Operária, depois transformada em Voz Operária. O PCB crescia a olhos vistos, reunindo mais de trezentos mil filiados e consolidando-se no meio cultural, fazendo com que inúmeros intelectuais passassem a fazer parte de seus quadros ou, no mínimo, se tornassem simpatizantes: Carlos Drummond de Andrade, Monteiro Lobato, Oscar Niemeyer, Villanova Artigas, Aníbel Machado, Dorival Caymmi, Nélson Pereira dos Santos, Procópio Ferreira, Carlos Scliar, Dalcídio Jurandir, Jacob Gorender, etc.

Diversas outras publicações sofreram, na época, a influência dos comunistas, tais como os jornais Momento Feminino, Terra Livre, Emancipação (de viés nacionalista) e as revistas Psyke, Joaquim, Divulgação Marxista, Revista do Povo (de conteúdo político, cultural e de variedades) e Literatura, esta última editada por iniciativa de Astrojildo Pereira, com seu conselho de redação composto por Álvaro Moreyra, Aníbal Machado, Arthur Ramos, Graciliano, Manuel Bandeira e Orígenes Lessa. Para manter todo este aparato, além da venda dos jornais, os militantes organizavam diferentes atividades de finanças, traduzidas em campanhas nacionais de arrecadação de fundos para a chamada imprensa popular: festivais, bailes, exposições artísticas, leilões, etc.

Com a cassação do PCB em 1947, a repressão desferida pelo governo Dutra sobre os comunistas foi responsável pela prisão de jornalistas, o empastelamento de diversos jornais partidários e a apreensão de muitas das suas tiragens, forçando o partido a trocar os nomes de várias das suas publicações para driblar a perseguição. O expediente não seria suficiente para evitar a crise vivida pelos comunistas no campo cultural, exacerbada ainda pela linha política sectária então abraçada como resposta à repressão, à ilegalidade e ao clima hostil da Guerra Fria.

Neste período, passaram a pontificar na imprensa partidária as diretrizes do realismo socialista formuladas pelo dirigente soviético Zdhanov, como na revista Problemas, órgão teórico controlado pelo Comitê Central, sob a direção inicial de Carlos Marighella e, depois, de Diógenes Arruda. Com tiragem média de oito mil exemplares, a publicação mensal, que circulou de 1947 a 1956, tinha como objetivo maior a divulgação do pensamento marxista-leninista, tendo provocado, no último ano de sua existência, a reação crítica de Astrojildo Pereira, segundo o qual a revista dedicara-se apenas a publicar traduções, quase sempre de autores soviéticos, sem jamais ter-se caracterizado como um veículo de discussão teórica dos problemas brasileiros. Outras publicações foram igualmente conduzidas a reproduzir a linha do realismo socialista no período, como Para Todos, no Rio; Seiva, que reaparecia em Salvador; Horizonte, em Porto Alegre e Orientação, em Recife. Dentro da mesma linha editorial, circulou em São Paulo, entre 1948 e 1955, a revista Fundamentos, sob responsabilidade de Armênio Guedes, Villanova Artigas, Monteiro Lobato, Caio Prado Júnior, entre outros.

Ao final da década de 1950, em meio às discussões internas provocadas pelo processo de "desestalinização", artistas e intelectuais ligados ao PCB, com atuação destacada nos movimentos sociais, formularam, na prática, as novas diretrizes da política cultural do partido, num clima de significativa liberdade de ação e produção de ideias. O Comitê Cultural foi, no período, o órgão do PCB responsável por organizar a prática e as propostas dos militantes comunistas junto ao setor intelectual, artístico e cultural. No movimento de massas, atuou sobretudo no interior do CPC da UNE, cuja luta por uma cultura nacional-popular casava-se com a estratégia da revolução democrático-burguesa. Do CPC fizeram parte nomes que, mais tarde, despontariam como figuras de grande expressão na cultura brasileira: Oduvaldo Vianna Filho, Ferreira Gullar, Gianfrancesco Guarnieri, Paulo Pontes, Arnaldo Jabor, Carlos Diegues, Carlos Nélson Coutinho, Leon Hirszman, Carlos Estevam Martins, José Carlos Capinam, dentre os quais Vianinha, destacava-se como o principal formulador político e organizador do grupo.

O PCB também exerceu forte influência sobre o Comando dos Trabalhadores Intelectuais (CTI), fundado em outubro de 1963 com o objetivo maior de coordenar os vários campos em que se articulavam lutas pela emancipação cultural do país, associadas à luta geral pela formação de uma frente única nacionalista e democrática com as demais forças populares. Alex Viany, Álvaro Vieira Pinto, Barbosa Lima Sobrinho, Dias Gomes, Ênio Silveira, Jorge Amado, Moacyr Félix, Nélson Werneck Sodré, Oscar Niemeyer, Osny Duarte Pereira, dentre outros, integraram a comissão diretora do CTI, em que destacavam-se as figuras de Moacyr Félix, eleito seu secretário-geral, e de Ênio Silveira, cuja editora Civilização Brasileira foi transformada no quartel-general da entidade e no principal ponto de encontro da intelectualidade de esquerda. Quase quatrocentas pessoas, dentre escritores, atores, diretores teatrais, pintores, cineastas, artistas do rádio e da TV, arquitetos, cantores e compositores, assinaram a lista de adesão ao CTI, que passou a ser visto como um sindicato dos intelectuais, devido à proposta de organização do meio cultural e à atuação política por intermédio de manifestos em prol das reformas e mudanças sociais.

Antes mesmo que o processo de desestalinização tomasse corpo no interior do PCB, surgiram duas importantes publicações coordenadas por comunistas, sem que a direção nacional do partido tomasse muita participação na definição das suas linhas editoriais. A Revista Brasiliense, articulada por Caio Prado Júnior e Elias Chaves Neto, apresentava-se como uma publicação político-cultural de inspiração marxista e nacionalista, mas independente e crítica em relação às teses do partido. Também com autonomia frente ao aparato partidário, ressurgia Para Todos, publicado entre 1956 e 1958 sob a forma de um jornal quinzenal dedicado aos temas culturais e aberto à intelectualidade. No seu primeiro ano de existência, cerca de setecentos nomes já haviam escrito para o veículo criado por iniciativa de Oscar Niemeyer, Jorge Amado, Alberto Passos Guimarães, Moacir Werneck de Castro e James Amado.

Por sua vez, a Revista Estudos Sociais foi criada pela direção nacional do PCB em maio-junho de 1958, como uma das deliberações tomadas com o intuito de redimensionar o papel da imprensa partidária, em meio às mudanças consolidadas com a Declaração de Março daquele ano. Com tiragem média de dois a três mil exemplares até o seu fechamento em 1964, foi, no período indicado, a principal publicação mantida pelo Comitê Central voltada a estimular o debate teórico acerca dos problemas brasileiros e a incrementar a educação política da militância comunista. Teve como diretores responsáveis Astrojildo Pereira, Armênio Guedes e o sociólogo Jorge Miglioli, que formaram o conselho de redação do veículo junto com os jornalistas Fausto Cupertino, Jacob Gorender, Mário Alves, Rui Facó, o filósofo Leandro Konder e, nas últimas edições, o historiador Nélson Werneck Sodré. Em seus quase seis anos de vida, acolheu a contribuição de cerca de setenta intelectuais das mais diversas áreas do conhecimento, totalizando perto de duzentos textos publicados, dentre ensaios, capítulos de livros inéditos, resenhas, críticas de livros e revistas e documentos históricos. Além dos membros da direção partidária e dos intelectuais comunistas mais influentes, como Alberto Passos Guimarães e Nelson Werneck Sodré, escreveram para a revista importantes figuras do pensamento nacional, como: o autor de Geografia da Fome, Josué de Castro, cientista brasileiro que presidiu a FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação); Hermínio Linhares, pesquisador do movimento operário; o antropólogo baiano Edison Carneiro, pioneiro dos estudos sobre o negro no Brasil.

No ano seguinte surgia, como órgão oficial do partido, por conseguinte com um caráter mais informativo e propagandístico do que a revista Estudos Sociais, o semanário Novos Rumos, encarregado de difundir a interpretação da realidade brasileira conforme as formulações teóricas dominantes entre os comunistas, com vistas a embasar as estratégias de luta pelo poder numa sociedade de capitalismo periférico como a brasileira. Comandado por Mário Alves (diretor), Orlando Bonfim Jr. (redator-chefe), Fragmon Carlos Borges (secretário) e contando com Almir Matos, Rui Facó, Josué Almeida, Paulo Mota Lima e Maria da Graça Dutra como redatores, o jornal trazia o dístico "Nacionalismo, democracia e socialismo" e propunha-se a integrar a frente nacionalista e democrática, defendendo os interesses do proletariado e baseando-se no marxismo-leninismo. Também em 1959, passava a circular a revista Problemas da Paz e do Socialismo, praticamente a edição nacional de uma publicação internacional dos partidos comunistas subordinados às orientações do PC da União Soviética.

(*) Secretário Nacional de Formação Política do PCB.


terça-feira, 20 de setembro de 2016

Ivan Pinheiro: “O governo interino é ilegítimo e corrupto”


A Verdade entrevistou Ivan Pinheiro, 70 anos, secretário-geral do Partido Comunista Brasileiro (PCB). Advogado, Ivan iniciou sua militância política ainda na juventude, no movimento estudantil do Rio de Janeiro. Em 1976, ingressou no PCB e foi eleito presidente do Sindicato dos Bancários, importante trincheira de resistência à Ditadura Militar. Nesta entrevista, expõe a opinião do PCB sobre a conjuntura nacional, a luta contra o governo golpista de Michel Temer e defende a unidade das forças populares na construção de uma alternativa à esquerda para a crise capitalista. Da Redação



A Verdade – Qual é a avaliação do PCB sobre a conjuntura brasileira?

Ivan Pinheiro – Os governos do PT só interessaram à burguesia enquanto garantiam lucros ao capital “como nunca antes na história do País”, nas palavras de Lula, e, ao mesmo tempo, funcionavam como eficientes bombeiros da luta de classe, cooptando entidades sindicais e de massas e passando para os trabalhadores a ilusão de que o governo (e não as suas lutas) garantiria seus direitos e seu futuro.

Em junho de 2013, veio o primeiro sinal de esgotamento desse ciclo de conciliação de classe, quando começaram a chegar ao Brasil fortes ventos da crise mundial sistêmica do capitalismo e os indícios de que o PT já não mais controlava e desmobilizava os trabalhadores e os setores populares.

Nesse quadro, para vencer a reeleição em 2014, Dilma fez um discurso desenvolvimentista, negando a crise econômica, dizendo que era mais fácil “a vaca tossir” do que retirar direitos trabalhistas. Vencendo a eleição, passou a governar com o programa neoliberal do candidato do PSDB, chamando Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda para fazer o ajuste fiscal, cortes em programas sociais e serviços públicos, flexibilizar direitos trabalhistas e previdenciários, privatizações em grande escala, etc. A presidente implanta a Lei Antiterrorismo para reprimir os movimentos populares e, em 18 de dezembro de 2015, assina o Acordo Militar Brasil/Estados Unidos¹, junto com Aldo Rabelo, então ministro da Defesa, de um partido que se apresenta como comunista.

Mesmo o governo cedendo às exigências do capital, a economia continua em recessão, criando um ambiente de ingovernabilidade. Mas, já no início de 2015, parte da burguesia começara a pautar o afastamento de Dilma porque – por mais que Lula e o PT palaciano aceitassem ceder mais às pressões burguesas – as contradições internas com alguns setores petistas ligados aos movimentos de massa atrasavam a conciliação. Durante 2015, continuaram as divergências no seio das classes dominantes em relação ao impeachment. Mas, no início de 2016, com o anúncio de mais queda no PIB e o aprofundamento da ingovernabilidade, o “comitê central” da burguesia fecha questão em afastar a presidente e impor o ilegítimo governo Temer, para tentar acelerar os ajustes que o PT vinha fazendo aos poucos.

O impeachment não foi um golpe de Estado clássico, até porque não se tratava de um governo de esquerda, nem mesmo reformista. Nos 13 anos de governos petistas, não houve qualquer avanço estrutural ou institucional. Mas é óbvio que a direita usou e abusou de manipulações midiáticas e jurídicas escandalosas e evidentes manobras institucionais e parlamentares, nos marcos “legais” da democracia burguesa. Na verdade, uma ditadura das classes dominantes. O PT havia cavado sua própria sepultura ao optar, desde a primeira posse de Lula, por alianças com partidos de centro-direita.

Como analisam o Governo Temer?

O surgimento do ilegítimo governo interino Temer deve ser usado didaticamente pelos comunistas para combatermos as ilusões de classe entre os trabalhadores, como a falácia de que é possível reformar e humanizar o capitalismo, de que nesse sistema há uma “democracia”, um “Estado Democrático de Direito”. Reparem que o partido que “traiu” o PT era seu principal aliado. No governo afastado, o PMDB tinha o vice-presidente, os presidentes da Câmara e do Senado e sete ministérios! Temos que combater Temer com toda energia, não lhe dar trégua um minuto sequer, para impedir que aplique as receitas que lhe encomendaram as classes dominantes. O governo interino é tão ilegítimo e corrupto que está também diante de uma crise de governabilidade. Minha impressão pessoal é de que o tiro da burguesia saiu pela culatra e que novas manobras institucionais estão sendo preparadas. Mas não podemos subestimar nem ficar esperando soluções dentro do sistema, pois a pauta neoliberal vai avançando no Parlamento.

A meu ver, as forças anticapitalistas e populares não devem gastar energias pela volta de um governo social-liberal petista, seja com a volta de Dilma ou com a eleição de Lula. Durante toda esta crise, ficou evidente que a trajetória do PT para a direita é um caminho sem volta. Para garantir a governabilidade, Dilma chegou ao ponto de propor publicamente um pacto nacional com a oposição de direita e de fazer de tudo para criar um novo “centrão” com as legendas mais fisiológicas e corruptas. Não esqueçamos que o czar da economia no governo Temer é o mesmo Henrique Meirelles, presidente do Banco Central nos oito anos de Governo Lula que, no auge do impeachment, tentava convencer Dilma a nomear esse banqueiro ministro da Fazenda para agradar ao “mercado”, aos credores e aos investidores nacionais e estrangeiros.

Não devemos também alimentar ilusões reformistas, como as propostas que circulam na esquerda, de novas eleições, reforma política ou constituinte. Com o possível fracasso do vergonhoso Governo Temer, essas alternativas institucionais serão a tábua de salvação para a burguesia: com a hegemonia que mantém na sociedade, eleger um “novo” governo do capital, agora legitimado pela “vontade popular”, para seguir com sua ofensiva contra os direitos sociais e trabalhistas.

Como o PCB vê a importância da unidade das forças populares e as alternativas para a crise?

O centro da nossa luta hoje deve ser o FORA TEMER, entendido como a resistência à ofensiva do capital, que atribuiu a ele a tarefa de flexibilizar mais ainda os direitos trabalhistas, generalizar a terceirização, privatizar o que resta de público e aprofundar os cortes nos programas sociais e a exploração do proletariado, além de saquear o orçamento público, tudo para garantir a recuperação das taxas de lucro dos grandes monopólios, o que se dará ao preço de mais repressão às lutas populares e restrições aos direitos de organização e manifestação.

Com o agravamento da crise mundial do capitalismo, que chega ao Brasil agora de forma dramática, haverá um acirramento das contradições entre o capital e o trabalho, portanto, da luta de classes, agora sem a cooptação do movimento sindical e de massas e com mais possibilidades de unidade na ação das forças da esquerda socialista. Seja qual for o governo de turno (a volta de Dilma, a permanência de Temer ou um novo presidente eleito), a ofensiva do capital seguirá. Mas estão criadas as condições para um grande crescimento do movimento de massas. No movimento sindical e operário, acredito em uma explosão semelhante à que ocorreu entre 1978 e 1985, quando os trabalhadores varreram os pelegos dos sindicatos. Haverá um grande crescimento das lutas por terra, teto, trabalho, direitos civis, saúde, educação e transportes públicos, e contra as discriminações de qualquer tipo.

Os comunistas e as forças populares de orientação anticapitalista têm o dever de contribuir para a unidade de ação nessas lutas. É preciso que essas forças promovam uma reunião nacional, o mais breve possível, para criarmos as condições de construir uma Frente Anticapitalista e Anti-imperialista e realizarmos, no primeiro semestre de 2017, um Encontro Nacional da Classe Trabalhadora e dos Movimentos Populares – independente do nome que venha a ter esse evento –, para que possamos dar amplitude nacional a um grande movimento de resistência às ofensivas do capital, que acumule para o surgimento de uma alternativa do proletariado na construção do poder popular e para pavimentar o caminho ao socialismo.

Nota:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Decreto/D8609.htm

FONTE: A VERDADE

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Movimento de Mulheres Olga Benario realiza 1º Encontro de Núcleos



Após cinco anos de existência e de muitas lutas, o Movimento de Mulheres Olga Benario dá provas de seu amadurecimento com a realização do seu 1º Encontro de Núcleos. A vontade de transformar a realidade foi o espírito das 80 mulheres que participaram do evento, no último dia 24 de julho, em Recife. Elas debateram a conjuntura nacional pela manhã e, à tarde, realizaram o debate sobre a construção e o fortalecimento dos núcleos do Olga em Pernambuco.

Estavam representados no encontro companheiras de vários bairros de Recife, além dos Municípios de Olinda, Paulista, Jaboatão, Moreno, Caruaru, Garanhuns, Afogados da Ingazeira, Serra Talhada e Petrolina, e ainda com a presença de Dona Rita, importante membro do trabalho do MLB que está atualmente residindo em Juazeiro da Bahia.

A diversidade de mulheres com a mesma convicção da necessidade de organização e luta deu a tônica do encontro. Eram estudantes, donas de casa, trabalhadoras, desempregadas, jovens e idosas com interesse central na transformação da vida das mulheres.

O evento contou ainda com a presença de Indira Xavier, representando a Coordenação Nacional do Movimento Olga Benário e de uma delegação de companheiras da Paraíba, tendo à frente a companheira Aline Leite. Destaque para a presença de representante do Grupo Mulher Maravilha, uma ONG que atua há 40 anos entre as mulheres do Bairro de Nova Descoberta, Casa Amarela, Recife.

Amadurecimento do Movimento

Tem sido uma batalha a consolidação do Olga Benário como Movimento Nacional, de afirmação de uma identidade político-ideológica, que se concretizou com a vitoriosa Ocupação Tina Martins e a construção da Casa de Referência da Mulher, em Belo Horizonte, Minas Gerais. Mas, para cumprir nosso real papel frente ao conjunto das mulheres brasileiras, temos uma grande caminhada pela frente.

O fundamental neste momento é nosso enraizamento, a construção de nossas bases, de elos com a vida das mulheres, onde elas vivem, trabalham e estudam. É fazer o debate de nossa opressão e fazer com que cada vez uma maior parcela de mulheres possa identificar o quanto esta sociedade capitalista, machista, homofóbica e racista está no centro de nosso sofrimento, o quanto interessa para a manutenção desse sistema que permaneçamos caladas, submissas, alienadas, desunidas e inertes. Quanto interessa aos que dominam e exploram nosso povo, desde o início das sociedades de classes, impedir que a massa de mulheres se levante, que queiram transformar suas vidas e, para isso, eles utilizam um imenso arsenal de instrumentos estruturais, legais, políticos, econômicos e ideológicos para manter seus privilégios.

O que podemos identificar é que esta conjuntura em que vivemos está favorável. A primavera feminista foi prova disso. As mulheres se mobilizaram nacionalmente e protagonizaram ações massivas em resposta à vontade de setores conservadores e reacionários de tolher as liberdades individuais conquistadas e de manter o domínio machista sobre o corpo das mulheres.

Quando começamos a pensar em construir o encontro para fortalecer os incipientes núcleos que começávamos a organizar em bairros populares, escolas, universidades, na Região Metropolitana de Recife e em algumas cidades do interior do Estado, pensávamos em mobilizar 50 mulheres, mas a realidade mostrou que estávamos subestimando a vontade destas em se organizar. Na verdade, pelo menos 120 quiseram participar e, se fizéssemos chegar mais longe nosso convite, poderíamos chegar a muito mais mulheres, já que essa nova consciência tem se forjado, e que esse movimento tem tido uma repercussão muito grande na vida das mulheres. Esse processo deixa claro que o Olga Benário não pode ser um movimento de eventos, ou ocasional, mas que precisa ter uma vida cotidiana.

Este processo de construção do Encontro de Núcleos também mostrou ser uma necessidade das mulheres deste país para sair de seu isolamento, de seus lamentos junto a seus botões, de esconder as violências, os assédios, a baixa autoestima, as discriminações, as desigualdades, as injustiças e começar a transformar suas vidas e a necessidade de se fortalecer coletivamente junto com outras mulheres que têm o mesmo quadro de vivência. Temos identificado que o papel do Olga neste momento é fortalecer essas mulheres, fazê-las identificar que as raízes do seu sofrimento estão na divisão da sociedade de classes, e que é necessário transformar seus lamentos em hasteamentos de bandeiras, em lutas anticapitalistas, em transformações de suas vidas e da sociedade em que vivemos.

Guita Kozmhinsky é da Coordenação do Movimento Olga Benario


FONTE: A VERDADE