Por Aluizio Moreira
O povo foi às ruas no dia 15 deste mês, numa manifestação que foi além do esperado pelos mais otimistas opositores do governo, ultrapassando o número de brasileiros que participaram do movimento Diretas-já em 1984. Cidadãos das mais diversas categorias sociais, ocuparam ruas e avenidas por este país afora.
Aos chamamentos contra a corrupção, juntaram-se protestos contra os ajustes na economia, pedidos de impeachment da presidente Dilma, gritos de “fora o PT”, apelo de “volta à ditadura militar”.
Não nos convencem os argumentos que os manifestantes eram majoritariamente eleitores de Aécio Neves, segundo pesquisa do Datafolha realizada junto aos participantes do movimento em São Paulo e Porto Alegre. Afinal as avaliações feitas pelo mesmo Instituto, apontam que o Governo Dilma foi considerado ruim/péssimo em todas as regiões do país: Sudeste 66%, Nordeste 55%, Sul 64%, Norte 51%, Centro-Oeste 75%. Nem mesmo no Nordeste onde Dilma teve uma expressiva votação para seu segundo mandato, a presidente teve bom desempenho nestes últimos meses. É bom que se registre que o Congresso, segundo a mesma fonte, teve uma rejeição avaliada como ruim/péssimo em 50%. São indicadores que apontam na direção de que a população não mais acredita na política, que passou a ser sinônimo de corrupção.
É evidente que o PSDB, numa atitude revanchista por ter seu candidato perdido a presidência para Dilma nas últimas eleições, participou ativamente das mobilizações contra Dilma e o PT. É evidente também a participação de golpistas, defensores do impeachment e da intervenção militar, que se integraram ao movimento. Sem esquecermos que a manifestação, segundo divulgação nos veículos virtuais de comunicação, contou com o apoio do PPS, e de políticos como Marta Suplicy, Eduardo Jorge (PV), Jarbas Vasconcelos (PMDB) e Marina Silva (PSB). Mas foi mais que isso.
Para Ricardo Antunes, sociólogo, professor da Unicamp, em entrevista ao Correio da Cidadania, o 15 de março foi “uma manifestação tardia da crise profunda que assolou o país a partir das manifestações de junho de 2013.” (Leia a entrevista aqui)
Na verdade concordamos com alguns analistas, quando afirmam que a questão não pode ser resumida simplesmente a uma disputa PT/PSDB.
Admitimos que nem se pode caracterizar essa ida às ruas, como um movimento saudosista dos tempos da ditadura militar, nem como resultado das maquinações do governo dos Estados Unidos, para desestabilizar alguns governos da América Latina, entre eles Venezuela e Bolívia. Embora conheçamos a politica intervencionista de Washington no cenário mundial. É simplificar demais essas tentativas de peculiarizar as mobilizações do 15 de março.
Admitimos que nem se pode caracterizar essa ida às ruas, como um movimento saudosista dos tempos da ditadura militar, nem como resultado das maquinações do governo dos Estados Unidos, para desestabilizar alguns governos da América Latina, entre eles Venezuela e Bolívia. Embora conheçamos a politica intervencionista de Washington no cenário mundial. É simplificar demais essas tentativas de peculiarizar as mobilizações do 15 de março.
É necessário que busquemos identificar o que está por traz de todas essas palavras de ordem, que na verdade se apresentam hoje de forma mais radicalizada, em comparação às reivindicações dos que foram ás ruas nas jornadas de junho de 2013.
O fato é que o governo ficou na retórica, desde aquelas jornadas em 2013. Adotou um esquema de alianças e compromissos com o que há de mais retrógrado na politica brasileira; acenou com medidas de caráter populares a favor dos trabalhadores, das minorias, que não cumpriu; assumiu que a saúde e a educação definitivamente não fazem parte da agenda do governo; manteve uma economia nos quadros do neoliberalismo, beneficiando o capital financeiro, dos grandes grupos nacionais e internacionais; cedeu à pressão contra o plebiscito ou o referendo no caso da reforma politica.
Dentro desse quadro, nem mesmo o impeachment da Presidente, conduziria o país para a solução dos problemas que a sociedade brasileira enfrenta hoje, pois substituiriam-se as pessoas e os partidos, mas no essencial não mudaria muita coisa, só os grupos no poder.
Respeitemos a opinião de Vladimir Safatle, livre-docente de filosofia da USP, quando afirma que “A Nova República acabou” (Leia aqui). Para nós o que acabou foi o próprio modelo de governo representativo, paradigma no mundo ocidental. Esse modelo esgotou-se. Os sintomas dessa crise final do capitalismo já estão postas em vários países da Europa. E por mais que se oponham à política de austeridade de seus governos, não há saída dentro do sistema, seja com o “Syriza” na Grécia, o “Podemos” na Espanha, a “Frente Nacional” na França, nem mesmo com o ultra-direitista UKIP na Inglaterra. Por quanto tempo esse sistema ainda resistirá, não o sabemos.
No nosso caso, algumas correntes politicas de esquerda, ainda levantam algumas hipóteses que apontam para "solução" de nossos problemas. Entre elas defendem: proteção das classes trabalhadoras diante da ofensiva do grande capital; compromisso com a reforma agrária; demarcação das terras indígenas; suspensão das medidas de austeridade que beneficiam o capital financeiro; reversão das privatizações; punição dos envolvidos com a corrupção; reforma política; tributação progressiva sobre grandes fortunas.
Mas como se estabeleceriam essas medidas “salvadoras”?
Ao nosso ver, a implantação dessas propostas esbarra em situações bastante concretas, entre elas: 1 - opção pelo modelo econômico neoliberal ao qual o Brasil tem se submetido, e que dificilmente deverá romper; 2- a correlação de forças presentes na Câmara e no Senado de tendência visivelmente conservadora, que representará um obstáculo no avanço nas conquistas das minorias e das demais forças populares; 3 – afastamento do governo das massas trabalhadoras, com medidas que ameaçam as conquistas trabalhistas (previdência, aposentadoria, seguro desemprego, flexibilização do trabalho etc), que viabilizam a reprodução capitalista; 4 – manutenção de um rede de alianças e compromissos, a fim de manter a governabilidade a todo custo.
O que se coloca hoje a nível das sociedades ocidentais em todo mundo, Brasil inclusive, é uma alternativa à democracia representativa, que serviu durante decênios aos interesses da burguesia, desde a derrocada dos regimes monárquicos, que ela mesma ajudou a derrubar. Seu ciclo de hegemonia aproxima-se do fim.
No nosso caso, o que poderia vislumbrar o fim da dominação burguesa, está longe de acontecer: não há uma liderança de esquerda capaz de congregar a população, organizando-a e orientando-a rumo ao estabelecimento de um governo popular, para nós, única forma de vencer os obstáculos e os descaminhos que trilham a sociedade brasileira. Nem mesmo uma união das esquerdas que possibilite a criação de uma ampla frente popular e democrática, que organize a sociedade civil, faz parte da agenda das discussões dos chamados partidos “revolucionários”.
Enquanto isso não acontece, continuaremos exercendo a “democracia do voto” (Leia aqui), que julgamos insuficiente para consolidação da "democracia", no sentido etimológico do termo.
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