Desenho de David Maciel. Arte final de Alexandre Pimenta
MARXISMO21
Há 200 anos, em 28 de novembro de 1820, nascia Friedrich Engels, em Barmen, na então Prússia Renana. Filho de um industrial do ramo têxtil, cedo desvinculou-se política e filosoficamente de sua origem e condição de classe participando do movimento intelectual de crítica à realidade alemã promovido pelos jovens hegelianos e se aproximando dos operários fabris e de sua luta na cidade de Manchester (Inglaterra), para onde foi enviado pelo pai para administrar os negócios da família. Esta posição permitiu-lhe passar da crítica da religião e da filosofia para a crítica da economia politica e para a centralidade da “questão social”, antes mesmo de seu encontro com Marx.
Com Marx elaborou os fundamentos teóricos e políticos do materialismo histórico, para o qual contribuiu não só como pensador original, trazendo contribuições em diversos temas, mas também como militante revolucionário, organicamente ligado ao movimento operário. Junto com Marx militou na Liga dos Comunistas e participou ativamente da Revolução de 1848-49 na Alemanha, chegando a “pegar em armas” contra as forças da ordem. Graças à sua condição social burguesa, como sócio de uma empresa industrial, Engels contribuiu financeiramente durante décadas para a sobrevivência de dezenas de militantes revolucionários, não apenas para Marx como também para organizações de trabalhadores, que tinham nele um apoio material permanente.
Como pesquisador original, Engels estudou e produziu obras importantes sobre um notável leque de temas e disciplinas, que foram da filosofia, da economia politica, da antropologia e da história à biologia, à química e à física, além da arte militar e do que hoje chamaríamos “tecnologia”. Foi, assim, um típico intelectual do século XIX, quando a especialização acadêmica ainda não pesava como uma mortalha sobre o cérebro dos vivos. Após se libertar do “cativeiro egípcio”, apodo com o qual ele designava jocosamente o trabalho na administração dos negócios da família, passou a se dedicar de modo integral à elaboração intelectual e à militância política, produzindo algumas das obras fundamentais do aparato marx-engelsiano, tornando-se um dos principais dirigentes da Associação Internacional dos Trabalhadores e contribuindo para a criação e formação teórico-política dos primeiros partidos operários.
Após a morte de Marx tornou-se o legatário da obra do camarada d’armas e amigo, responsabilizando-se por sua divulgação e pela publicação de diversos trabalhos ainda inéditos, entre os quais os livros II e III d’O Capital (dos quais é um verdadeiro co-autor tamanho o volume de suas intervenções para sistematizar e mesmo complementar os manuscritos deixados por Marx). Em seus últimos anos, Engels tornou-se uma espécie “farol” do movimento socialista internacional, esclarecendo problemas conceituais e políticos suscitados pela ascensão do marxismo à condição de principal referência teórico-política do movimento operário e aconselhando dirigentes partidários e sindicais em sua luta cotidiana (apesar de nem sempre os dirigentes social-democratas seguirem seus conselhos!). Faleceu em Londres, em 5 de agosto de 1895, com 75 anos incompletos.
Durante muito tempo seus esforços para abordar temas das ciências físicas e naturais à luz do materialismo histórico e para sistematizar os resultados teóricos a que chegaram Marx e ele em suas pesquisas foram vistas como uma tentativa de transformar o materialismo histórico numa doutrina filosófico-científica global, capaz de tratar de qualquer assunto a partir determinados postulados apriorísticos, suscitando críticas de diversos autores, particularmente ligados à tradição do chamado marxismo ocidental, que viam neste esforço uma negação do método marxiano das “aproximações sucessivas”. Esses questionaram o senso comum no movimento socialista em torno da identidade entre os dois fundadores do materialismo histórico presente na entidade “Marx-Engels” como um mito fabricado com finalidades políticas pela social democracia e mais tarde pelo stalinismo (que incorporou Lênin e Stálin ao duo), insistindo nas diferenças entre os dois, e acusaram Engels de abrir as portas para a contaminação positivista do marxismo. Neste âmbito sua obra. passou a ser negligenciada, tida como irrelevante ou desviante da real perspectiva analítica de Marx. De “segundo violino”, como ele mesmo definiu seu papel na criação do materialismo histórico, Engels caiu para a condição de primeiro “marxista positivista”, o que contribuiu para o esquecimento de sua contribuição fundamental para áreas tão variadas como a historiografia, a antropologia, a sociologia do trabalho, a ciência política e a própria crítica da economia política.
No entanto, as pesquisas suscitadas pela edição das obras completas de Marx e Engels a partir dos anos 70 e a incorporação de suas contribuições como uma referência fundamental para pesquisas em áreas diversas das ciências sociais tem suscitado a retomada dos estudos em torno de sua obra e uma compreensão mais equilibrada e realista de sua contribuição para o marxismo, para as ciências sociais e para a luta revolucionária. O dossiê que ora publicamos se orienta nesta direção.
Editoria, 16 de novembro de 2020
FONTE: Portal do PCB
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