quinta-feira, 19 de agosto de 2021

Mandel: O socialismo e o futuro. Façamos renascer a esperança


Ernest Mandel – É preciso defender um modelo de socialismo que será totalmente emancipatório em todas os terrenos da vida. Este socialismo deverá ser autogestionário, feminista, ecológico, radicalmente pacifista, pluralista, estendendo qualitativamente a democracia, e ser internacionalista e pluripartidário. 

Restaurar a credibilidade do socialismo

Desde a metade dos anos 1970, ocorreu em escala mundial uma deterioração da correlação de forças entre as classes. A razão principal foi o início de uma onda depressiva de longa duração na economia capitalista com um contínuo crescimento do desemprego. Nos países imperialistas, o desemprego aumentou de 10 para 50 milhões de pessoas; no Terceiro Mundo chegou a 500 milhões. Em vários dos países do Terceiro Mundo, isso significa 50% ou mais da população estando sem trabalho.

Esse massivo aumento no desemprego, e o medo do desemprego entre aqueles que têm trabalho, enfraqueceu a classe trabalhadora e facilitou a ofensiva capitalista mundial voltada para o aumento das taxas de lucro através do arrocho do salário real e do corte de investimentos sociais e infraestruturais. A ofensiva neoconservadora é somente a expressão ideológica dessa ofensiva econômica e social.

A larga maioria da lideranças dos partidos de massa que se reivindicam socialistas capitularam diante desta ofensiva capitalista, e aceitaram políticas de austeridade; isso tem sido visto em diversos países como França, Espanha, Nova Zelândia, Suécia, Venezuela e Peru. Isso desorientou a classe trabalhadora e, durante todo um período, tornou mais difícil para as massas de encarar as lutas defensivas.

Essa capitulação da socialdemocracia esteve conectada ao impacto ideológico e político da crise do sistema do Leste europeu, da ex-União Soviética, da República Popular da China e Indochina, que está fomentando uma profunda e quase universal crise de credibilidade do socialismo.

Aos olhos da grande maioria da população do planeta, as duas principais experiências históricas de construção de uma sociedade sem classes – a stalinista/pós-stalinista/maoista e a socialdemocrata – falharam.

É claro, as massas entendem muito bem que esta é a derrota de um objetivo social radical global. Mas isso não implica uma avaliação negativa das importantes mudanças concretas que ocorreram na realidade social em favor dos explorados. Nesse sentido, o balanço de mais de 150 anos de atividade do movimento internacional dos trabalhadores e todas as suas tendências permanece positivo.

Mas isso não é o mesmo que uma crença de milhões de trabalhadores de que todas as lutas imediatas irão progressivamente levar à luta pela derrubada do capitalismo e ao advento de uma sociedade sem classes, sem exploração, opressão, injustiça ou violência em massa. Na ausência de tal convicção, as lutas imediatas são fragmentadas e descontínuas, sem objetivos políticos globais.

A iniciativa política está nas mãos do imperialismo, da burguesia e seus agentes. Isso é claro pelo que está acontecendo na Europa do Leste onde a queda das ditaduras burocráticas sob o impacto de amplas lutas de massa não levou a iniciativas políticas em direção ao socialismo, mas em direção à restauração do capitalismo. A mesma coisa está começando a ocorrer na antiga União Soviética.

As massas na Europa do Leste e na antiga União Soviética, para não mencionar países como Camboja, identificam a ditadura stalinista e pós-estalinista com marxismo e socialismo, e rejeitam tudo isso igualmente. Stálin assassinou um milhão de comunistas e reprimiu milhões de trabalhadores e camponeses.

Isso não foi produto do marxismo, do socialismo ou da revolução; isso foi resultado de uma sangrenta contrarrevolução. Mas que as massas continuam vendo essas coisas de maneira diferente é um fato objetivo que se sustenta fortemente sobre realidades políticas e sociais internacionais.

Essa crise de credibilidade do socialismo explica a contradição principal da situação mundial em um momento no qual as massas estão lutando em vários países, frequentemente em uma escala mais larga do que em qualquer período anterior.

De um lado, o imperialismo e a burguesia internacional não são capazes de esmagar o movimento dos trabalhadores como fizeram nos anos 1930 e início dos anos 1940 em grandes cidades da Europa e do Japão e em vários outros países. Mas, de outro lado, as massas trabalhadoras ainda não estão preparadas para lutar por uma solução anticapitalista global. Por essa razão, nós estamos em um período de crise mundial e desordem em que nenhuma das principais classes sociais é capaz de assegurar sua vitória histórica.

A principal tarefa dos socialistas e comunistas é tentar restaurar é tentar restaurar a credibilidade do socialismo na consciência de milhões de homens e mulheres. Isso será possível somente se o nosso ponto de partida for as necessidades e preocupações imediatas dessas massas. Qualquer modelo alternativo de economia política deve incluir essas propostas. Essas propostas devem dar o mais concreto e eficiente auxílio para as massas lutarem com sucesso por suas necessidades.

Nós podemos formular isso em termos quase bíblicos: eliminar a fome, agasalhar os sem roupa, dar uma vida digna a todos, salvar as vidas daqueles que morrem por falta de atendimento médico adequado, generalizar o acesso gratuito à cultura incluindo a eliminação do analfabetismo, universalizar as liberdades democráticas, os direitos humanos e eliminar a violência repressiva em todas as suas formas.

Impulsionar, sem restrições, amplas lutas de massas

Nada disso é dogmático ou utópico. Ainda que as massas não estejam prontas para lutar pela revolução socialista, elas podem aceitar inteiramente esses objetivos se eles forem formulados na forma mais concreta possível. Eles podem levar a amplas lutas nas mais diversas formas e combinações. Para isso nós devemos tentar ser o mais concretos possíveis em nossas proposições. Que tipo de produção alimentar é possível? Com quais técnicas agrárias? Em quais regiões? Quais materiais podem ser produzidos? Em quais localidades ou nações na mais larga escala internacional?

Mas quando nós examinamos as condições necessárias para atingir esses objetivos, chegamos à conclusão de que tal programa implica uma redistribuição radical dos recursos existentes e uma mudança radical nas forças sociais que têm o poder de decisão sob suas mãos. Nós devemos estar convencidos de que as massas que estão lutando por esses objetivos não irão abandonar a luta quando a realidade demonstrar essas implicações.

Aqui reside um dos desafios históricos diante do movimento socialista: ser capaz, sem condições prévias, de liderar as mais amplas lutas de massa para atingir as mais urgentes necessidades atuais da humanidade.

Tal modelo alternativo é possível em nossa sociedade atual sem um objetivo de curto ou médio prazo de tomar ou participar do poder concreto, em curto ou médio prazo? Eu acredito que esta seja uma forma equivocada de colocar a questão. É claro que não há nenhum modo de se esquivar do problema do poder político. Mas a forma concreta da luta pelo poder e, sobretudo, as formas concretas de poder estatal não devem ser decididas de antemão. Acima de tudo, a formulação de objetivos concretos e de formas concretas de luta por necessidades definitivas não deve ser subordinada a objetivos realizáveis em curto prazo no plano político.

Pelo contrário, os objetivos e formas de luta devem ser determinados sem nenhum prejuízo político. A fórmula deve ser aquela do grande taticista Napoleão Bonaparte, que foi repetida muitas vezes por Lênin: on s’engage et puis on voit (“entremos na batalha e então veremos”).

É esse o modo pelo qual o movimento internacional dos trabalhadores, durante o período de sua mais impressionante atividade de massas, conduziu suas campanhas de luta por dois objetivos centrais: a jornada de trabalho de 8 horas diárias e o sufrágio universal.

Não pode o imperialismo hoje ou, mais precisamente, o imperialismo aliado ao grande capital, impedir a realização destes mesmos objetivos nos países da América Latina? Não pode o imperialismo bloquear o influxo de capital e a transferência de tecnologia ainda mais do que já está sendo feito através das pressões do FMI e do Banco Mundial?

Novamente, eu acredito que colocar a questão desta forma pode nos levar a uma armadilha. A verdade é que ninguém pode dar uma resposta a isso de antemão. Em última instância, tudo depende da correlação de forças. Mas estas não são pré-determinadas e estão constantemente mudando.

No mais, a luta pela ação de massas por objetivos realizáveis e precisos é exatamente uma forma de alterar a correlação de forças em favor dos trabalhadores e todos os explorados e oprimidos.

Não deve ser esquecido que o imperialismo está sofrendo uma profunda crise de liderança. Enquanto consolidava sua dominação militar, o imperialismo Ianque perdeu sua dominação tecnológica e financeira. Não é mais capaz de impor seu desejo sobre seus principais competidores, os imperialismos japonês e alemão. Também não consegue controlar as possíveis reações de massa nos EUA ou em uma escala internacional.

Sob essas condições, existem muitas possíveis formas para uma luta bem sucedida por um cancelamento imediato dos pagamentos da dívida externa. É altamente improvável que os governos latino-americanos e aqueles do Terceiro Mundo irão tomar algum passo neste sentido. Mas se um país como o Brasil, na eventualidade de uma vitória do PT, fosse fazer isso, nós não poderíamos de antemão prever a reação do imperialismo. Eles poderiam impor um bloqueio econômico, mas é muito mais difícil bloquear o Brasil, o mais desenvolvido país da América Latina, do que países menores como Cuba, para não mencionar a Nicarágua.

E o Brasil tem a capacidade de responder com uma ofensiva política, com um Brest-Litovski político-econômico, dirigindo-se a vários países e massas de todos os países dizendo: “Vocês concordam que nosso povo seja punido por querer eliminar a fome, o adoecimento e as violações de direitos humanos?” A resposta das massas trabalhadoras do mundo não é uma conclusão pré-determinada. Poderia ser insuficiente, poderia ser positiva. Mas é uma grande batalha que poderia mudar a situação política mundial. Poderia permitir uma posterior mudança na correlação de forças; poderia ajudar a restaurar a fé em um mundo melhor.

Concretizar iniciativas comuns, nacionais e internacionais

Esses temas são o enfoque metodológico fundamental de Karl Marx: a luta pelo socialismo não é a imposição dogmática e sectária de um objetivo pré-estabelecido sobre o movimento real das massas. É somente a expressão consciente desse movimento através do qual os elementos constituintes de uma nova sociedade podem germinar das sementes do velho.

Nós podemos ilustrar esses temas em relação aos problemas centrais de hoje. Companhias multinacionais uma dominação maior sobre setores ainda mais largos do mercado mundial. Elas representam uma forma qualitativamente superior da centralização internacional de capital. Isso leva a uma maior internacionalização da luta de classes.

Infelizmente, a burguesia internacional é muito mais preparada e coerente neste sentido do que a classe trabalhadora. Em um sentido fundamental, existem somente duas respostas possíveis para a classe trabalhadora diante das ações das multinacionais: ou ela recua em direção ao protecionismo e à defesa da chamada competitividade nacional, isto é, a colaboração de classes com os patrões e os governos de cada país contra “os japoneses”, “os alemães” ou “os mexicanos”; ou solidariedade com os trabalhadores de todos os países e contra todos os exploradores nacionais e internacionais.

No primeiro caso, ocorreria uma inevitável espiral decrescente de cortes nos salários, proteção social e condições de trabalho em todos os países, porque as multinacionais poderia sempre explorar um país com salários mais baixos, transferir a produção para lá ou chantagear o movimento dos trabalhadores para fornecer concessões de antemão.

No segundo caso, existe ao menos a possibilidade de uma espiral crescente que pode aumentar os salários, melhorar a proteção social dos países menos desenvolvidos e reduzir as diferenças nos padrões de vida de um modo positivo.

Essa segunda possível resposta não é de modo algum oposta ao desenvolvimento econômico ou à criação de empregos no Terceiro Mundo. Isso implica, na verdade, outro modelo de desenvolvimento que não seja baseado na exportação de baixos salários, mas no crescimento do mercado nacional e da satisfação das necessidades básicas do povo.

A luta por essa resposta internacionalista para a ofensiva das companhias multinacionais requer imediatamente a concretização de iniciativas comuns a nível sindical, especialmente entre delegados combativos, críticos, independentes, de base, em todas as fábricas do mundo trabalhando para a mesma transnacional ou no mesmo ramo industrial. Isso já se iniciou de modo pequeno mas, no entanto, real. O projeto do Mercado Comum norte-americano, a tentativa de transformar o México em uma vasta zona maquiladora [zonas de “economia livre”, com baixos salários], abrem o caminho para essa resposta e isto pode ser estendido para toda a América Latina em oposição à chamada “Iniciativa das Américas”.

Ao mesmo tempo, os chamados novos movimentos sociais basicamente refletem a angústia de amplas camadas sociais abandonadas pela dinâmica do capitalismo tardio. Essa dinâmica envolve o perigo de que essas camadas progressivamente se despolitizem e possam constituir uma base social para ataques da direita, incluindo os neofascistas, contra as liberdades democráticas. Qualquer política de “paz social” ou de consensos pseudo-realistas com a burguesia produzem a impressão de que basicamente não há outras opções políticas, e assim fazem pioram o perigo. Este é o motivo pelo qual é vital para o movimento de trabalhadores estabelecer alianças estruturais com as “classes baixas”, os desorganizados, e ajudá-los a se organizar, se defender e conquistar dignidade e esperança.

Em todos esses casos, isto deve ser feito de uma maneira não-dogmática, sem a atitude de alguém que possui toda a verdade – a resposta definitiva. A construção do socialismo é um enorme laboratório de novas experiências que ainda permanecem indefinidas. Nós devemos aprender da prática, especialmente, dessas mesmas massas. Por esse motivo, nós devemos estar abertos para dialogar e discutir fraternalmente com toda a esquerda, com todos defendendo firmemente os princípios de suas correntes e organizações.

Em um sentido mais amplo, nós devemos levar em conta o fato de que o que está em jogo no mundo hoje é dramático: é literalmente uma questão de sobrevivência física da humanidade. Fome, epidemias, poder nuclear, a deterioração do meio ambiente: tudo isso é a realidade fundamental da nova e velha desordem capitalista mundial.

No Terceiro Mundo, 16 milhões de crianças morrem de fome e doenças curáveis por ano. Isto é equivalente a 25% do número de mortes na segunda guerra mundial, incluindo Hiroshima e Auschwitz. Em outras palavras, a cada quatro anos, existe uma guerra mundial contra crianças. Esta é a realidade do imperialismo e do capitalismo hoje.

Esta realidade desumana produz efeitos políticos e ideológicos desumanos. No nordeste brasileiro, a falta de vitaminas na dieta dos pobres produziu novas espécies de inanição, de homens e mulheres que passaram por alterações físicas que os fazem 30 centímetros menores que outras pessoas do mesmo país. Existem milhões desses desafortunados, chamados pela classe dominante e seus agentes de “ratos humanos”, com todas as implicações desumanas de tais termos, reminiscentes daqueles desenvolvidos pelos nazistas.

Com a restauração gradual do capitalismo no leste europeu e na antiga União Soviética, tudo que é bárbaro e socialmente retrógrado está começando a ser reproduzido. A privatização de grandes empresas poderia gerar até 35-40 milhões de desempregados e uma queda de 40% nos ganhos dos trabalhadores.

O caráter emancipatório do socialismo

O socialismo poderia reaver sua credibilidade e validade se estiver pronto para se identificar totalmente com as lutas contra essas ameaças. Isso supõe três condições:

(1) A primeira é que sob nenhuma circunstância ele subordine seu apoio para as lutas sociais das massas a um projeto político. Nós devemos estar incondicionalmente ao lado das massas em todas as suas lutas.

(2) A segunda é a propaganda e a educação entre as massas do objetivo global, um modelo de socialismo que integre as principais experiências e novas formas de consciência das últimas décadas.

É preciso defender um modelo de socialismo que será totalmente emancipatório em todas os terrenos da vida. Este socialismo deverá ser autogestionário, feminista, ecológico, radicalmente pacifista, pluralista, estendendo qualitativamente a democracia, e ser internacionalista e pluripartidário.

Mas é essencial que seja emancipador para os produtores diretos, o que é impossível sem o progressivo desaparecimento da divisão social do trabalho entre aqueles que produzem e aqueles que administram.

Os produtores devem possuir o poder de decisão real sobre o que eles produzem e receber a melhor parte do produto social. Este poder deve ser exercido de uma maneira completamente democrática; isto é, deve expressar as aspirações reais das massas. Isto é impossível sem pluralismo partidário e sem a possibilidade das massas escolherem entre várias variantes concretas do planejamento econômico central. Também é impossível sem uma redução radical na carga de trabalho diária e semanal.

Mais ou menos todos concordam a respeito do nível crescente de corrupção e criminalização na sociedade burguesa e nas sociedades pós-capitalistas em desaparecimento. É utópico e irrealista esperar pela moralização da sociedade civil e do estado sem uma radical redução da importância das economias de dinheiro e de mercado.

Uma visão coerente do socialismo não pode ser defendida sem sistematicamente se opor ao individualismo e a busca de ganhos individuais independentemente de suas consequências para a sociedade como um todo. A prioridade deve ser a solidariedade e a cooperação. E isso pressupõe, precisamente, uma redução decisiva da importância do dinheiro na sociedade.

(3) A terceira condição é a total renúncia da parte dos socialistas e comunistas de todas as práticas substitucionistas, paternalistas e verticalistas. Nós devemos refletir sobre e transmitir a principal contribuição de Karl Marx para a política: a emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores. Não pode ser realizada por estados, governos, partidos, líderes supostamente infalíveis ou especialistas de qualquer tipo. Todos estes são úteis, até mesmo indispensáveis, para a luta pela emancipação. Mas eles somente podem auxiliar as massas a se libertarem; não podem ser um substituto para elas. Não é somente imoral, mas impraticável tentar assegurar a felicidade das pessoas contra suas próprias convicções. Esta é uma das principais lições que podem ser extraídas do colapso das ditaduras burocráticas na Europa do leste e na ex-URSS.

A prática dos socialistas e comunistas deve ser totalmente consistente com seus princípios. Nós não devemos justificar nenhuma prática alienadora ou opressora. Nós devemos, na prática, realizar o que Karl Marx chamou de imperativo categórico: lutar contra todas as condições em que seres humanos são alienados e humilhados. Se nossa prática for consistente com esse imperativo, o socialismo irá recuperar uma incrível força e legitimidade política que o tornará invencível.

Fonte da matéria: https://blogdaboitempo.com.br/2018/04/03/mandel-o-socialismo-e-o-futuro-facamos-renascer-a-esperanca/



quarta-feira, 11 de agosto de 2021

Notas sobre capitalismo e socialismo (4)


Por Wladimir Pomar

 



Um ca­pi­ta­lismo in­dus­trial e co­mer­cial su­bor­di­nado, de­pen­dente e des­na­ci­o­na­li­zado, ao qual foi agre­gada uma fração agrí­cola mo­der­ni­zada à custa da maior parte da so­ci­e­dade, tendia não só a manter, mas a agravar aquilo que al­guns au­tores chamam de “de­si­gual­dade ana­crô­nica”. Um dos exem­plos mais ca­rac­te­rís­ticos dessa ten­dência, ou da in­ca­pa­ci­dade do ca­pi­ta­lismo bra­si­leiro em mudar os ele­vados graus de de­si­gual­dade so­cial, pode ser en­con­trado na crise que se se­guiu ao “mi­lagre econô­mico” da di­ta­dura mi­litar.
 
Tal mi­lagre chegou a sus­citar es­pe­ranças em se­tores da pró­pria classe ope­rária. Esta, re­no­vada e en­gros­sada pelos grandes con­tin­gentes de ex-agre­gados ru­rais li­be­rados para vender sua força de tra­balho nos cen­tros ur­banos, nu­triu ilu­sões de que o pro­cesso de ge­ração de em­pregos seria cons­tante. No en­tanto, sendo su­bor­di­nado, de­pen­dente e des­na­ci­o­na­li­zado, o mi­lagre ca­pi­ta­lista co­man­dado pela di­ta­dura foi in­capaz de re­sistir às crises mun­diais do pe­tróleo e da dí­vida ex­terna dos anos 1970 e 1980. Morreu, for­çando uma re­ti­rada es­tra­té­gica dos mi­li­tares. E deixou como he­rança um de­sem­prego de grande parte dos que ha­viam sido des­lo­cados dos campos para as ci­dades, dando origem a uma imensa massa ex­cluída, na qual so­bres­saem os sem (es­cola)-sem (em­prego).
 
É ver­dade que os in­te­lec­tuais desse ca­pi­ta­lismo des­car­regam sobre o pró­prio povo bra­si­leiro a res­pon­sa­bi­li­dade por tais in­for­tú­nios. Para al­guns deles, um povo mes­tiço, criado pela co­lo­ni­zação lusa atra­sada, ja­mais seria capaz de se­guir os passos dos “pi­o­neiros” norte-ame­ri­canos. Para ou­tros, ao con­trário, seria jus­ta­mente a mes­ti­çagem que nos em­pur­raria para a frente. Di­zendo de outro modo, ambos acre­ditam que a raça é o fator de­ci­sivo para ex­plicar os traços ca­rac­te­rís­ticos de nosso povo e de suas classes so­ciais. Dei­xaram de lado a pes­quisa his­tó­rica sobre o de­sen­vol­vi­mento real das forças pro­du­tivas e das re­la­ções de pro­dução no Brasil. E chegam a ex­pli­citar que a co­lo­ni­zação do Brasil teria sido di­fe­rente se hou­vesse sido re­a­li­zada pelos in­gleses ou pelos ho­lan­deses, a exemplo da co­lo­ni­zação in­glesa da Amé­rica do Norte.
 
Com isso, por exemplo, es­quecem ou en­co­brem os re­sul­tados da co­lo­ni­zação in­glesa na Índia e na África do Sul e da ho­lan­desa na In­do­nésia, di­fe­rentes da que ocorreu na Amé­rica do Norte. Como já vimos, os Es­tados Unidos não ti­veram a mesma sorte (ou azar) da Índia e do Brasil porque a In­gla­terra pre­ci­sava re­duzir a pressão po­pu­la­ci­onal dos des­ter­rados pela cri­ação de ove­lhas e pelo de­sen­vol­vi­mento ainda in­ci­pi­ente das ma­nu­fa­turas. Grande parte das terras par­ca­mente ha­bi­tadas da Amé­rica do Norte de então apre­sen­tavam con­di­ções para re­ceber tais des­ter­rados, onde po­diam es­ta­be­lecer-se como agri­cul­tores in­de­pen­dentes e até co­piar as novas téc­nicas e re­la­ções de pro­dução que es­tavam sendo im­plan­tadas na me­tró­pole. Nas colô­nias nor­tistas pu­deram de­sen­volver uma in­dús­tria local e, para com­pletar, re­a­li­zaram duas guerras re­vo­lu­ci­o­ná­rias, a de in­de­pen­dência e a de li­qui­dação do es­cra­vismo e im­plan­tação do tra­balho as­sa­la­riado em todos os Es­tados Unidos.

Assim, en­quanto a bur­guesia norte-ame­ri­cana, na se­gunda me­tade do sé­culo 19, le­gi­ti­mava sua he­ge­monia econô­mica e so­cial, seja em con­fronto aberto com a Es­panha, seja dis­far­ça­da­mente com a In­gla­terra, a in­sig­ni­fi­cante bur­guesia bra­si­leira so­mente deu seus pri­meiros passos no final da­quele sé­culo, com as ex­pe­ri­ên­cias fra­cas­sadas e/ou es­ma­gadas do Barão de Mauá e de Del­miro Gou­veia. Sob in­fluência do tra­ta­mento dado pelos la­ti­fun­diá­rios a seus agre­gados, nas três pri­meiras dé­cadas do sé­culo 20 tal bur­guesia ainda se es­for­çava para de­mons­trar que rei­vin­di­ca­ções ope­rá­rias não pas­savam de ar­ru­aças e as­suntos po­li­ciais. Se­gundo ela, greves não de­ve­riam fazer parte das ca­rac­te­rís­ticas do povo dócil e cor­dial que teria, pa­ci­fi­ca­mente, “con­quis­tado” sua in­de­pen­dência, “li­ber­tado” os es­cravos e “pro­cla­mado” a Re­pú­blica.

É ló­gico que essa bur­guesia, su­bor­di­nada aos la­ti­fun­diá­rios, não con­se­guia es­conder to­tal­mente a ocor­rência da Con­fe­de­ração do Equador, dos Al­fai­ates, da Ba­laiada, das Ca­ba­nadas, de Ca­nudos e de ou­tras re­voltas po­pu­lares da his­tória bra­si­leira. Mas esses acon­te­ci­mentos foram sempre con­si­de­rados pontos fora da curva e, como tais, te­riam me­re­cido um es­ma­ga­mento exem­plar. Talvez por isso vá­rios au­tores não se aca­nhem em afirmar que, no Brasil, a bur­guesia surgiu no sé­culo 16, e o pro­le­ta­riado no final do sé­culo 20.

Contra todas as evi­dên­cias his­tó­ricas, tentam jus­ti­ficar tal dis­pa­rate ci­tando a bur­guesia eu­ro­peia, que teria sido for­jada como classe muitos sé­culos antes da exis­tência do pro­le­ta­riado. A ver­dade é que tal bur­guesia, em­bora sur­gindo pri­meiro como classe média pro­pri­e­tária su­bal­terna, não do­mi­nante, só acu­mulou força econô­mica, so­cial e po­lí­tica à me­dida que su­bor­dinou sua cir­cu­lação de mer­ca­do­rias ao de­sen­vol­vi­mento de suas ma­nu­fa­turas aci­o­nadas pelo tra­balho as­sa­la­riado. E só re­a­lizou a re­vo­lução bur­guesa para con­quistar o poder po­lí­tico e exercer sua he­ge­monia quando seu poder econô­mico al­cançou di­mensão igual ou su­pe­rior ao dos feu­dais.

Em ou­tras pa­la­vras, os au­tores que eli­minam as re­la­ções de pro­dução as­sa­la­ri­adas como base para a ge­ração da mais-valia e a acu­mu­lação de força econô­mica des­co­nhecem que, em­bora os ha­bi­tantes dos burgos da Idade Média fossem cha­mados de bur­gueses, a bur­guesia so­mente se con­formou como classe so­cial quando o sis­tema de uso da força de tra­balho livre pelo as­sa­la­ri­a­mento se tornou pre­do­mi­nante. Sem tal re­lação de pro­dução ha­veria bur­gueses ha­bi­tantes de burgos, mas não bur­guesia como classe so­cial.

A bur­guesia “bra­si­leira”, cons­ti­tuída em grande parte por par­celas ou fra­ções es­tran­geiras e por la­ti­fun­diá­rios que apro­vei­taram a ne­ces­sária subs­ti­tuição das im­por­ta­ções para se tor­narem in­dus­triais, só co­meçou a ga­nhar corpo nas pri­meiras dé­cadas do sé­culo 20. Nos anos 1930 e 1940, época de crise e guerra mun­dial, a fração na­ci­onal dessa bur­guesia cresceu ba­fe­jada por in­ves­ti­mentos e fi­nan­ci­a­mentos es­ta­tais, mas não chegou a ter um poder econô­mico e uma he­ge­monia que lhe per­mi­tisse subs­ti­tuir a classe la­ti­fun­diária e as fra­ções es­tran­geiras no poder po­lítico.

Essa fração na­ci­onal man­teve-se sempre su­bor­di­nada à classe la­ti­fun­diária e às fra­ções ca­pi­ta­listas es­tran­geiras, em es­pe­cial à norte-ame­ri­cana. Viveu sempre do acordo ou da con­ci­li­ação com esses se­tores do­mi­nantes, tor­nando-se in­capaz de di­rigir qual­quer pro­cesso real de de­sen­vol­vi­mento ca­pi­ta­lista so­be­rano. Mesmo du­rante a di­ta­dura mi­litar, que mo­der­nizou os la­ti­fún­dios e trans­formou seus pro­pri­e­tá­rios em fração agrária da bur­guesia, com­ple­tando o pro­cesso de im­plan­tação do sis­tema ca­pi­ta­lista no Brasil, a fração bur­guesa na­ci­onal foi in­capaz de se impor. A he­ge­monia con­ti­nuou em poder dos se­tores in­dus­triais e fi­nan­ceiros es­tran­geiros, en­quanto os la­ti­fun­diá­rios se re­or­ga­ni­zavam como fração agrária da bur­guesia.

Essas ca­rac­te­rís­ticas pró­prias da evo­lução da for­mação econô­mica e so­cial bra­si­leira cau­saram inú­meros em­ba­raços aos seus es­tu­di­osos. Al­gumas cor­rentes au­to­de­no­mi­nadas mar­xistas che­garam a ad­mitir a exis­tência de uma for­mação so­cial feudal, tendo por base as re­la­ções de agre­gação apa­ren­tadas ao feu­da­lismo. O que levou al­guns a con­si­de­rarem que a bur­guesia na­ci­onal de­veria ter um papel re­vo­lu­ci­o­nário. Su­pu­seram que ela po­deria trans­formar as re­la­ções de pro­dução (uni­ver­sa­li­zação do tra­balho as­sa­la­riado), de­sen­volver o ca­pi­ta­lismo e até mesmo criar as con­di­ções para a re­vo­lução so­ci­a­lista de­pois que a re­vo­lução de­mo­crá­tico-bur­guesa hou­vesse cum­prido seu papel his­tó­rico. As di­fe­rentes ali­anças e a su­bor­di­nação dessas cor­rentes a se­tores da bur­guesia ti­nham por base esse pres­su­posto teó­rico.

Ou­tras cor­rentes mar­xistas ten­taram es­capar desse em­ba­raço ana­lí­tico de­fen­dendo que o modo de pro­dução do­mi­nante no Brasil teria sido es­cra­vista co­lo­nial. O que pode ex­plicar a maior parte da so­ci­e­dade bra­si­leira até 1888, mas não o meio sé­culo se­guinte em que pre­do­minou a agre­gação e em que, nas ci­dades, se dis­se­mi­naram as re­la­ções mo­ne­tá­rias para a compra e venda da força de tra­balho. Para com­plicar, ainda houve cor­rentes que re­sol­veram virar Marx de ca­beça para baixo e afirmar que a co­lo­ni­zação no Brasil e nos de­mais países da Amé­rica La­tina teria sido ca­pi­ta­lista, ou que con­si­de­ravam a eco­nomia mun­dial uma es­tru­tura centro-pe­ri­feria que se per­pe­tu­aria, mesmo em ritmos di­fe­rentes.

Um es­tudo mais apro­priado do de­sen­vol­vi­mento ca­pi­ta­lista nos Es­tados Unidos e no Brasil du­rante as dé­cadas de 1970-1990 pode de­mons­trar com mais crueza como as ten­dên­cias do ca­pi­ta­lismo avan­çado, pre­vistas por Marx, foram in­ten­si­fi­cadas, e como as ca­rac­te­rís­ticas de­si­guais de su­bor­di­nação, de­pen­dência e des­na­ci­o­na­li­zação do ca­pi­ta­lismo bra­si­leiro se acen­tu­aram.

Nos Es­tados Unidos sur­giram cor­po­ra­ções ainda mai­ores do que as mul­ti­na­ci­o­nais, as trans­na­ci­o­nais. Elas uti­li­zaram cada vez mais seu poder de mo­no­pólio e de oli­go­pólio para eli­minar a con­cor­rência (ou com­pe­tição), dri­blar as leis an­ti­truste, con­cen­trar e cen­tra­lizar cada vez mais a ri­queza (1% da po­pu­lação norte-ame­ri­cana detém mais ri­queza do que os de­mais 99%), não dar qual­quer atenção aos pro­blemas eco­ló­gicos e, cada vez mais, subs­ti­tuir o tra­balho vivo (re­a­li­zado di­re­ta­mente pelos ho­mens) pelo tra­balho morto (re­a­li­zado por má­quinas pro­gra­madas), in­ten­si­fi­cando o de­sem­prego es­tru­tural e as pau­pe­ri­za­ções ab­so­luta e re­la­tiva.

Além disso, na busca pela cen­tra­li­zação dos ca­pi­tais e pela ele­vação do lucro, o ca­pi­ta­lismo norte-ame­ri­cano in­ten­si­ficou as ex­por­ta­ções de ca­pital, seja na forma fi­nan­ceira, seja na forma de trans­fe­rência de plantas in­dus­triais seg­men­tadas e/ou com­pletas. Assim, por um lado sa­queou e de­sin­dus­tri­a­lizou eco­no­mias na­ci­o­nais su­bor­di­nadas aos ca­pi­tais es­pe­cu­la­tivos (caso do Brasil) e de­sin­dus­tri­a­lizou a si pró­prio (vide Trump). Por outro, in­ten­si­ficou a in­dus­tri­a­li­zação de países atra­sados do ponto de vista ca­pi­ta­lista, mas po­li­ti­ca­mente so­be­ranos, cri­ando novos con­cor­rentes (casos da China, Índia etc.).

A bur­guesia bra­si­leira, he­ge­mo­ni­zada por suas fra­ções fi­nan­ceira, in­dus­trial es­tran­geira e, cres­cen­te­mente, também por sua fração agrária, em obe­di­ência às po­lí­ticas ne­o­li­be­rais do Con­senso de Washington, operou nessas mesmas dé­cadas para fazer com que o país re­tor­nasse à po­sição de ex­por­tador de com­mo­di­ties mi­ne­rais e agrí­colas e de centro de trans­fe­rência da ri­queza na­ci­onal (ex­pressa no pro­duto na­ci­onal bruto) para os países ca­pi­ta­listas cen­trais.

O re­sul­tado, evi­den­ciado na crise do final dos anos 1990, foi a pri­va­ti­zação e a trans­fe­rência, para ou­tros países, de grande parte do parque in­dus­trial im­plan­tado nos anos an­te­ri­ores (na prá­tica, uma quebra ou de­sin­dus­tri­a­li­zação in­dus­trial), a in­ten­si­fi­cação do de­sem­prego e das de­si­gual­dades so­ciais, e a cres­cente as­censão do agro­ne­gócio, ou da fração agrária da bur­guesia, a uma po­sição he­gemô­nica em par­ceria com as fra­ções fi­nan­ceira e es­tran­geira.


FONTE: Correio da Cidadania


segunda-feira, 2 de agosto de 2021

Angélica Lovatto e a originalidade do pensamento marxista


Formada em Filosofia pela USP, comunista, é trabalhadora

 

Oriunda de Diadema, no ABCD paulista, a intelectual orgânica Angélica Lovatto vem há três décadas desenvolvendo um pensamento radical sobre o momento em que vivemos a partir da tradição marxista

  

Por Luiza Coppieters

 

Em meu artigo anterior, eu procurei demonstrar como o pensamento pós-moderno é contrarrevolucionário. Os fundamentos para tal exposição vêm de dois autores que venho estudando. O livro de Carlos Nelson Coutinho, O Estruturalismo e A Miséria da Razão, e exposições da professora e militante Angélica Lovatto.

Oriunda de Diadema, no ABCD paulista, a intelectual orgânica Angélica Lovatto vem há três décadas desenvolvendo um pensamento radical sobre o momento em que vivemos a partir da tradição marxista. De Marx a Lúkacs, passando por pensadores brasileiros como Vânia Bambirra e Carlos Nelson Coutinho, Lovatto está elaborando uma interpretação sobre o que chama de “as quatro contrarrevoluções” e “o pensamento pós-moderno e transgressão resignada”.

De acordo com ela, o pensamento burguês teria elaborado quatro ideologias, em momentos distintos, ao pensamento marxiano para barrar a luta da classe trabalhadora. São ideologias que se colocam como de esquerda mas que serviriam aos interesses da burguesia. Como ela costuma dizer, “a ideologia mais difícil de se combater, é a ideologia que se apresenta como de esquerda”.

Em um primeiro momento, o positivismo nas ciências sociais, em especial Max Weber e Émile Durkheim, se apresentariam como ideologias que visariam o estudo da sociedade fora da compreensão da luta de classes, fariam análises de fatos sociais independentes de processos históricos e que tomariam o real como não contraditório em si.

O existencialismo seria a segunda onda contrarrevolucionária na medida em que negaria o humanismo, negando o sujeito histórico – a classe trabalhadora - para centrar em um indivíduo lançado num mundo cruel e, portanto, sem história também.

O terceiro momento é o do estruturalismo, como o de Lévi-Strauss, em que a linguagem anterior a toda historicidade e, ao mesmo tempo, estruturante de uma realidade incapaz de ser perscrutável nas suas contradições levaria ao agnosticismo, isto é, a um pseudo-conhecimento do real, já que nega as contradições do real.

O quarto momento, este em que vivemos, é o da pós-modernidade. Como expliquei em artigo anterior, como tudo é fragmentário e não há centralidade da classe trabalhadora, mas subjetividades e atores, cabe elaborar epistemes para traçar narrativas. Não há espaço para o pensamento totalizante e tampouco espaço para a ação transformadora do real e, assim, saída do capitalismo.

Lovatto irá chamar o discurso pós-moderno de “transgressão resignada”, na medida em que esses indivíduos, esses atores de si mesmos, por meio de suas narrativas, sempre fragmentárias, irão transgredir as normas estabelecidas mas que nada produzirão de transformação concreta. Narram suas dores e vivências para se resignarem em suas condições ou, no máximo, ocuparem um espaço dentro da lógica capitalista e usufruir de benesses em posição de destaque.

Trata-se, pois, de uma elaboração original do pensamento marxista e aponta para a superação desses discursos que engessam e colocam a classe trabalhadora em conflito entre si.

Estudiosa do ISEB, Instituto Superior de Estudos Brasileiros, e de grandes pensadores que foram apagados pela geração pós 68, Angélica Lovatto vem elaborando uma crítica ao pensamento uspiano, especialmente no que tange às ideias de populismo, autoritarismo e democracia como valor universal.

Para além de resgatar um passado, Lovatto enfrenta um presente que nega a possibilidade da Revolução Brasileira e a centralidade do trabalho e tenta a todo custo colocar o debate político nos marcos liberais.

Vale a pena acompanhar esta intelectual orgânica, seja nas redes sociais, seja em sua trincheira de luta na Unesp de Marília.

 

Luiza Coppieters 

Formada em Filosofia pela USP, comunista, é trabalhadora

 FONTE: Brasil247