terça-feira, 27 de dezembro de 2011

OWEN, Robert

Robert Owen, ao lado de Saint-Simon e Fourier, é considerado socialista utópico e ao mesmo tempo, principal representante do socialismo inglês da primeira metade do século XIX.

A formação e evolução de seu pensamento político e social, estão estreitamente ligadas às suas atividades práticas.

Jean-Christian Petitfils em sua obra "Os Socialismo Utópicos", identifica três etapas na vida de Owen: a primeira, quando se tornou empresário e filântropo; a segunda de 1817 a 1829, quando adere ao socialismo associacionista e cooperativo; a terceira, de 1830 a 1834, quando inicia sua militância no movimento operário inglês.

Nasceu em 1771, em Newton, País de Gales, descendente de uma família pobre. Seu pai foi ferreiro e encarregado de correio. De empregado no comércio em Londres e Manchester, chegou a ser diretor de uma fábrica nesta última, e daí proprietário de uma empresa têxtil em New Lanark, na Escócia.

Como proprietário de fábrica pôde por em prática suas idéias reformistas, sempre no sentido de melhorar a vida dos trabalhadores e seus familiares: abriu escolas para os filhos de trabalhadores, não admitia o trabalho de menores de 10 anos (prática muito comum na Inglaterra naquela época), adotou uma jornada de trabalho de 10 horas e meia ( quando o normal era de 15, 16 horas), criou uma cooperativa, vendendo a preços baixos alimentação e vestuário, fundou caixas de previdência para assistência médica e amparo à velhice.

Depois do fracasso de sua empresa, Owen começou a abandonar as idéias filantrópicas e aproximou-se das idéias comunistas, admitindo que a propriedade privada era um absurdo, uma irracionalidade. Começou a questionar o fato do trabalho humano produzir riquezas e os trabalhadores que as produziam não terem acesso a essas riquezas. Dessas e outras questões, nasceu a idéia da criação de comunidades igualitárias, que tenta por em prática com a fundação, na América do Norte, da comunidade "New Harmony".

Com base no ideal comunista, na qual o lema seria "de cada um segundo seu trabalho, a cada um segundo suas necessidades", considerou que todos os membros da comunidade seriam considerados como parte de uma imensa e mesma família, na qual todos teriam direito à alimentação, ao vestuário, à educação, à moradia. É verdade que antes mesmo de Owen conceber e por em prática seus planos criação de comunidades "comunistas" , muitas foram criadas por leigos e religiosos. Mas a grande diferença é que para Owen, tratava-se da instituição de uma nova ordem social que abrangesse toda a sociedade humana, e não apenas comunidades igualitárias restritas a alguns grupos como as orientadas pelo fourierismo e por diversas seitas religiosas.

Com o fracasso de sua experiência em New Harmony e de volta à Inglaterra, se aproximou das associações de artesãos e adere ao movimento sindical ao qual se dedica até 1834, com 64 anos de idade, quando então se afasta da militância sindical. Mas o seu afastamento da luta operária, não significará o fim de sua atividade. Fixando-se em Londres, viaja constantemente pronunciando conferências e escrevendo para jornais. Tentou ainda fundar em Queenwood, em Hampshire, uma aldeia comunitária que também fracassa como fracassara New Harmony.

Em 1848, por ocasião das revoluções burguesas que eclodiram em quase toda Europa, Owen deslocou-se para Paris a fim de acompanhar os acontecimentos políticos.

Sobre Robert Owen, Friedrich Engels ("Do Socialismo Utópico ao Socialismo Científico") deixou o seguinte comentário":
Todos os movimentos sociais, todos os progressos reais registrados na Inglaterra em interesse da classe trabalhadora, estão ligados ao nome de Owen. Assim, em 1819, depois de cinco anos de grandes esforços, conseguiu que fosse votada a primeira lei limitando o trabalho da mulher e das crianças nas fábricas. Foi ele que presidiu o primeiro congresso em que as TRADE-UNIONS de toda a Inglaterra fundiram-se numa grande organização sindical única. E foi também ele quem criou, como medidas de transição, para que a sociedade pudesse organizar-se de maneira integralmente comunista, de um lado, as cooperativas de consumo e de produção - que serviram, pelo menos, para demonstrar na prática que o comerciante e o fabricante não são indispensáveis - e por outro lado, os mercados operários, estabelecimentos de troca dos produtos do trabalho por meio de bônus de trabalho e cuja unidade é a hora de trabalho produzido;  (...)
Owen faleceu em 1858 com 87 anos de idade, um dia após ter pronunciado um discurso num congresso operário.

Dentre suas obras escritas, são as mais marcantes: "Nova Visão da Sociedade" (1813-1814), "Relatório do Condado de Lanark" (1815-1821), "Livro do Novo Mundo Moral" (1836), "Autobiografia" (1857).


(Dados compilados por Aluizio Moreira)

Fontes:
Arquivo Marxista na Internet
BEER, Max. História do socialismo e das lutas sociais.São Paulo:Expressão Popular,2006.
BRAVO, Gian Mario. Historia do socialismo. Lisboa:Europa-America, 1977, 3 vols.
COLE, G.D.H. Historia del pensamiento socialista.Mexico:Fondo de Cultura, 1957-1960, 7 vols.
DROZ, Jacques (Dir). Historia geral do socialismo. Lisboa: Horizonte, 1972-1977, 9 vols.
HOFMANN, Werner. A historia do pensamento do movimento social dos séculos 19 e 20. Rio de Janeiro:Tempo Brasileiro, 1984.
PETITFILS, Jean-Christian. Os socialistas utópicos. São Paulo: Circulo do Livro, s/d.

sábado, 24 de dezembro de 2011

Declaração do 13º Encontro Internacional de Partidos Comunistas e Operários



Realizou-se em Atenas de 9 a 11 de Dezembro de 2011 o 13º Encontro Internacional de Partidos Comunistas e Operários, com o tema “O Socialismo é o futuro!” 




A situação internacional e sobre as experiências dos comunistas, 20 anos após a contra-revolução na URSS. As tarefas para o desenvolvimento da luta de classes nas condições da crise capitalista e das guerras imperialistas, as actuais lutas e levantamentos populares pelos direitos operário-populares, o fortalecimento do internacionalismo proletário e da frente anti-imperialista, pelo derrube do capitalismo e a construção do socialismo.

O Encontro contou com a participação de 78 Partidos, de 59 países. Vários Partidos que, por motivos alheios à sua vontade, não poderam estar presentes, enviaram mensagens escritas. Saudamos, a partir de Atenas, as crescentes lutas populares, das quais resulta um enorme potencial emancipador contra o imperialismo, contra a exploração e opressão capitalistas e pelos direitos sociais, laborais e à segurança social dos trabalhadores de todo o mundo.

O Encontro realizou-se em condições complexas, em que a situação internacional continua dominada pela persistente e cada vez mais profunda crise capitalista, bem como pela escalada da agressividade do imperialismo expressa nas decisões da Cimeira de Lisboa que aprovou o novo conceito estratégico da NATO. Esta realidade confirma as análises das declarações dos X, XI e XII Encontro Internacionais, realizados no Brasil (São Paulo) em 2008, na Índia (Nova Delhi) em 2009 e na África do Sul (Tshwane) em 2010.

Torna-se crescentemente óbvio para milhões de trabalhadores que a crise é uma crise do sistema. Não resulta de falhas no sistema, mas da falha que é o próprio sistema, gerando crises regulares e periódicas. Resulta do aprofundamento da principal contradição do capitalismo, entre o carácter social da produção e a apropriação capitalista privada, e não de uma qualquer versão das políticas de gestão do sistema ou duma qualquer aberração resultante da ganância de alguns banqueiros ou outros capitalistas, ou da ausência de mecanismos de regulação eficazes. A crise põe em evidencia os limites históricos do sistema e a necessidade de fortalecer as lutas por rupturas anti-monopolistas e anti-capitalistas, da superação revolucionária do capitalismo.

O impasse das várias versões de gestão burguesa estão a ser demonstradas nos EUA, Japão, União Europeia e em outras economias capitalistas. Por um lado, a linha de políticas restritivas conduz a uma longa e profunda recessão, enquanto por outro lado, políticas expansionistas com enormes pacotes de ajudas aos grupos monopolistas, ao capital financeiro e à banca, aumentam a inflacção e inflacionam a dívidas pública. O capitalismo converte a insolvência dos grupos económicos em insolvências soberanas.

O capitalismo não tem outra resposta para a crise a não ser a da destruição massiva de forças produtivas e de recursos, a dos despedimentos em massa, do encerramento de empresas, do ataque global aos salários, pensões e segurança social, que não a da redução dos rendimentos do povo, do aumento exponencial do desemprego e da pobreza.

A ofensiva anti-popular aprofunda-se e manifesta-se com particular intensidade em certas regiões. A concentração e centralização do capital monopolista aprofunda o carácter reaccionário do poder económico e político. A re-estruturação capitalista e as privatizações estão a ser promovidas, visando a competitividade e a maximização do lucro do capital, assegurando uma força de trabalho mais barata e a regressão de décadas dos direitos sociais e laborais.

A intensidade da crise, a sua sincronização global, a perspectiva duma recuperação débil, intensificam as dificuldades das forças burguesas para gerir a crise, conduzindo ao agudizar das contradições e rivalidades inter-imperialistas, ao mesmo tempo que aumenta o perigo de guerras imperialistas.

Os ataques contra os direitos democráticos e contra a soberania intensificam-se em muitos países. Os sistemas políticos tornam-se mais reaccionários. O anti-comunismo reforça-se. Generalizam-se as medidas contra a actividade dos partidos comunistas e operários, contra as liberdades sindicais, políticas e democráticas. As classes dominantes desenvolvem uma tentativa multi-facetada para enclausurar o descontentamento popular através de mudanças nos sistemas políticos, da utilização duma série de ONGs e outras organizações pró-imperialistas, através das tentativas de canalizar o descontentamento popular para movimentos de cariz alegadamente apolítico, ou mesmo de características reaccionárias.

Saudamos as importantes lutas e levantamentos dos trabalhadores e dos povos pelos direitos sociais, democráticos e políticos, contra os regimes anti-populares no Médio Oriente e no Norte de África, nomeadamente na Tunísia e no Egipto. Apesar das contradições que a actual situação manifesta, tais acontecimentos constituem uma experiência significativa que o movimento comunista deve estudar e utilizar.

Simultaneamente condenamos veementemente a guerra imperialista da NATO e da União Europeia contra o povo Líbio, bem como as ameaças e ingerências nos assuntos internos da Síria e do Irão. Consideramos que qualquer intervenção estrangeira contra o Irão, independentemente do pretexto invocado, ataca os interesses dos trabalhadores iranianos e as suas lutas por direitos sociais e liberdades democráticas.

Estes desenvolvimentos confirmam a necessidade de fortalecer os Partidos Comunistas, de forma a poderem desempenhar o seu papel histórico, fortalecendo ainda mais a luta dos trabalhadores e dos povos em defesa dos seus direitos e aspirações, tirando partido das contradições do sistema e das contradições inter-imperialistas para assegurar uma ruptura ao nível do poder e da economia, que satisfaça as necessidades populares. Sem o papel dirigente dos partidos comunistas e da classe de vanguarda, a classe operária, os povos tornam-se vulneráveis à confusão, assimilação e manipulação por parte das forças que representam os monopólios, o capital financeiro e o imperialismo.

Estão em cursos significativos realinhamentos na correlação de forças mundial. Verifica-se o enfraquecimento relativo da posição dos EUA, uma estagnação produtiva geral nas economias capitalistas mais avançadas e a emergência de novas potências económicas globais, com destaque para a China. Intensifica-se a tendência para o aprofundamento das contradições entre os centros imperialistas e entre estes com as chamadas economias emergentes.

Intensifica-se a agressividade do imperialismo. Os focos de tensão e guerra regionais multiplicam-se: Na Ásia e em África e no Médio Oriente com a crescente agressividade de Israel, em particular contra o povo palestiniano. Ao mesmo tempo verifica-se a emergência de forças xenófobas e neo-nazis na Europa, as intervenções multifacetada, as ameaças e a ofensiva contra os movimentos populares e as forças políticas progressistas na América Latina.

Aumenta o risco de uma conflagração geral ao nível regional. Neste sentido o alargamento e o fortalecimento da frente social e política anti-imperialista e das lutas pela paz na direcção da erradicação das causas das guerras imperialistas são fundamentais.

Há duas vias de desenvolvimento:

a via capitalista, a via da exploração dos povos, repleta de grandes perigos de guerras imperialistas e para os direitos dos trabalhadores e dos povos;

e a via da libertação com imensas possibilidades para a promoção dos interesses dos trabalhadores e dos povos, para a conquista de justiça social, soberania popular, paz e progresso. O caminho das lutas dos trabalhadores e dos povos, o caminho do socialismo e do comunismo, que é historicamente necessário.

Graças à contribuição decisiva dos comunistas e do movimento sindical de classe, as lutas dos trabalhadores na Europa e em todo o mundo fortaleceram-se. A agressividade imperialista continua a deparar-se com uma forte e decidida resistência popular no Médio, na Ásia e na América Latina. Este facto, a par com a experiência acumulada até agora, especialmente na América Latina.

Saudamos as lutas dos trabalhadores e dos povos e assinalamos que não são ainda suficientes. A realidade exige a intensificação da luta de classes, da luta ideológica, política e de massas, de forma a travar quaisquer medidas anti-populares e promover objectivos de luta que correspondam às necessidades actuais dos povos e exijam uma contra-ofensiva organizada dos trabalhadores pela demolição de todo o edifício capitalista e a abolição da exploração do homem pelo homem.

Hoje estão criadas as condições para a construção de amplas alianças sociais anti-monopolistas e anti-imperialistas, capazes de lutar pelo poder e de promover profundas transformações progressistas, radicais e revolucionárias. A unidade da classe operária, a sua organização e uma orientação de classe do movimento operário são factores fundamentais para assegurar a construção de efectivas alianças sociais com o campesinato, as camadas médias urbanas, o movimento das mulheres e o movimento da juventude.

Nesta luta, o papel dos partidos comunistas e operários é indispensável a nível nacional, regional e internacional. A acção conjunta e coordenada dos Partidos Comunistas e das organizações juvenis comunistas pode contribuir para o alargamento da luta anti-imperialista.

A luta ideológica do movimento comunista é de importância vital para repudiar o anti-comunismo contemporâneo, fazer frente à ideologia burguesa, às teorias anticientíficas e às correntes oportunistas que rejeitam a luta de classes, e para combater o papel das forças social-democratas que defendem e concretizam as políticas anti-populares e pró-imperialistas, apoiando a estratégia do capital e do imperialismo. A compreensão da natureza unificada das tarefas de luta pela emancipação social, nacional e de classe, pela promoção clara da alternativa socialista, exige uma contra-ofensiva ideológica do movimento comunista.

Só o socialismo pode erradicar as guerras, o desemprego, a fome, a miséria, o analfabetismo, a insegurança de centenas de milhões de pessoa, a destruição do ambiente. Só o socialismo cria as condições para um desenvolvimento segundo as necessidades dos trabalhadores nos dias de hoje.

Operários, camponeses, trabalhadores da cidade e do campo, mulheres, jovens, apelamo-vos para que lutem junto de nós para pôr fim à barbárie capitalista. Existe uma esperança, existe uma perspectiva. O futuro pertence-nos.

O SOCIALISMO É O FUTURO!

FONTE: ODiário.info

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Desenvolvimento e socialismo

Por Gilberto Maringoni (*)

Introdução

A possibilidade concreta de se viabilizar uma transição ao socialismo está hoje fora da agenda da sociedade brasileira. A hegemonia burguesa consolidou-se, após um longo período de defensiva das idéias socialistas. Parte da esquerda formada a partir dos anos 1970-80 adaptou-se e ajudou a consolidar tal hegemonia, conferindo-lhe inédita legitimidade. Essa parcela significativa da esquerda que inclui lideranças políticas, sindicais e populares dá nova qualidade ao pacto de classes estabelecido no Brasil, após a eleição de Luís Inácio Lula da Silva à presidência, em 2002. Estabeleceu-se uma aliança sólida entre tais setores e o grande capital financeiro e industrial e o agronegócio, em torno de um projeto de desenvolvimento. Embora se percebam vários matizes no interior desse grande acordo, a maior parte de seus agentes se unifica em torno de algumas linhas-mestras:

1.Absoluta prioridade aos setores rentistas, para os quais se destina cerca de 40% do orçamento federal, sob a rubrica de pagamento dos serviços da dívida pública, baseados nos juros reais mais altos do mundo;

 2. Manutenção de uma taxa de câmbio valorizada, que favorece o capital externo e os setores exportadores de produtos não industrializados;

3. Livre circulação de capitais;

4. Expansão do mercado interno, através da elevação do salário mínimo e de programas de transferência de renda;

5. Diversificação dos parceiros comerciais do Brasil no plano externo e

6. Manutenção de toda ordem jurídico-institucional criada para a implantação do modelo neoliberal.

Não se trata mais do neoliberalismo puro e duro dos anos 1990, quando aconteceram as privatizações em massa e o grosso das reformas constitucionais que garantiram a nova ordem. Tudo se deu ao custo de aumento do desemprego e de três crises consecutivas na economia brasileira. Esse viés mais radical do mercadismo perdeu legitimidade, mas permanece vivo nas páginas e telas da grande mídia e nos partidos de direita.

Atualmente, mantidas suas características básicas, o modelo se arraigou na sociedade brasileira, gerando moderadas taxas de crescimento econômico, além de uma melhoria no padrão de vida dos assalariados e da adoção de políticas sociais focadas.

Num plano muito minoritário em termos de expressão política, existe um projeto à esquerda - que contempla também várias nuances. Na verdade, não se conforma nitidamente como alternativa, mas como ideário disperso em alguns setores sociais. Ele poderia, genericamente, ser classificado como democrático-popular. Essa vertente envolve frações dos trabalhadores, da pequena e média burguesia e mesmo partes minoritárias da burguesia. Algumas dessas formações encontram-se abrigadas no pacto de classes majoritário e, vez por outra, exibem descontentamentos com os rumos da orientação geral.

Como tratar a questão da transição do capitalismo para o socialismo nessas balizas concretas? Como colocar o tema no plano da tática - ou seja, da política - e não no terreno de uma estratégia desvinculada da formação social e econômica e social atual do país?

Este pequeno texto não responde a tais questões. Elas seguem em aberto nos dias que correm. Busca-se aqui tão somente apontar a necessidade de articulação entre um projeto de desenvolvimento democrático e popular nos marcos do capitalismo realmente existente e a luta pelo socialismo.

Problema tático

Duas décadas depois da derrocada dos regimes do socialismo real, que gerou uma aguda crise política e ideológica na esquerda mundial, e quase uma década após a chegada ao poder de um partido de origem popular no Brasil, o que significa exatamente advogar uma ruptura socialista?

Um objetivo como esse não pode ser uma construção apenas doutrinária, desvinculada das lutas e condições da realidade política. Ruptura - ou revolução - e socialismo não são valores ou categorias morais. São, antes de tudo, objetivos políticos, inseridos na real disputa de forças na sociedade. Isso implica estabelecer metas de curto, médio e longo prazo, examinar quem são os sujeitos políticos dessa empreitada, os aliados e os inimigos e traçar um programa mínimo e um programa máximo de ação. Em outras palavras, são partes da construção de uma tática e de uma estratégia política. Não se trata assim de tarefa acadêmica. Uma articulação desse tipo deve captar uma necessidade expressiva na sociedade, tendo como núcleo fundamental os trabalhadores, os setores pobres da cidade e do campo e parcelas da pequena burguesia. Outras frações de classe podem eventualmente se juntar nessa empreitada, dependendo das condições concretas da disputa política.

Ao longo das últimas duas décadas, revolução passou a ser um conceito tido como obsoleto. A queda do muro de Berlim, em 1989, a derrota eleitoral dos sandinistas na Nicarágua, em 1990, o desmanche da União Soviética, em 1991, e a supremacia do modelo neoliberal em quase todo o mundo, acuaram as forças que pregavam mudanças na ordem social. A própria idéia de revolução, no sentido de uma transformação radical da realidade, foi colocada em xeque. Ela voltou à baila primeiro pelas mãos do presidente venezuelano, Hugo Chávez, que desde sua chegada ao poder, em 1998, alardeia comandar uma revolução em seu país. Mais recentemente, as mobilizações populares nos países árabes chegaram a ser chamadas de revolução. Independente da exatidão ou não na utilização do termo, o certo é que ele saiu do limbo a que foi relegado há duas décadas.

O que é uma revolução? As definições sobre uma mudança de tal natureza foram sintetizadas por Caio Prado Júnior (1907-1990):

Revolução, em seu sentido real e profundo, significa o processo histórico assinalado por reformas e modificações econômicas, sociais e políticas sucessivas que, concentradas em período histórico relativamente curto, vão dar em transformações estruturais da sociedade, e em especial das relações econômicas e do equilíbrio recíproco das diferentes classes e categorias sociais .

Fernando Claudín (1915-1990), histórico dirigente comunista espanhol, destaca um traço fundamental nas revoluções:

Toda revolução social, tanto socialista como burguesa, compreende como momento necessário a revolução política, a passagem do poder a uma nova classe.

O debate sobre processos revolucionários pode levar à discussão de outro conceito banido da agenda política: o projeto socialista. Se, como dizia Marx, o socialismo representará o desenvolvimento máximo das forças produtivas, com a disseminação do bem-estar e da qualidade de vida, há que se superar o desenvolvimento capitalista, mudando sua qualidade, guardando algumas de suas características, mas negando outras, essenciais, para a construção de uma nova síntese que pode ser genericamente chamada de desenvolvimento socialista.

A esquerda e o desenvolvimentismo

Embora o desenvolvimento econômico sob o capitalismo seja um projeto essencialmente burguês, é preciso levar em conta algumas de suas características. No caso brasileiro recente, o aumento da massa salarial, a expansão dos níveis de emprego e a disseminação do crédito acabam por atrair largos setores dos trabalhadores para o pacto dominante. A melhoria imediata dos padrões de vida, como acontece atualmente em vários países da América Latina, após duas décadas de estagnação, consolidou a idéia que o desenvolvimento é igualmente bom para todos.

Celso Furtado (1920-2004), o mais radical e talentoso reformista burguês do Brasil, diferenciava desenvolvimento de crescimento. Para ele, "O crescimento econômico, tal qual o conhecemos, vem se fundando na preservação dos privilégios das elites que satisfazem seu afã de modernização; já o desenvolvimento se caracteriza pelo seu projeto social subjacente. Dispor de recursos para investir está longe de ser condição suficiente para preparar um melhor futuro para a massa da população. Mas quando o projeto social prioriza a efetiva melhoria das condições de vida dessa população, o crescimento se metamorfoseia em desenvolvimento".

Ou seja, trata-se de um processo de transformação social. Essa transformação será tão mais profunda quanto mais a esquerda socialista souber empreender uma luta política para fazer aliados e formular programas na luta por um desenvolvimento distributivista, democrático e ecologicamente sustentável, que aponte para o socialismo. Não se coloca aqui em dúvida que a transformação almejada será socialista. Discute-se a tática a ser empreendida. Ela depende dos rumos a serem traçados, mas sobretudo da luta e das condições política concretas.

Para definir os atores sociais de uma empreitada dessa envergadura, é preciso apontar o que se quer e onde se deseja chegar. A estratégia de transformação conformará a frente de interesses e de interessados, deixando claro quais os beneficiados e quais os prejudicados com o processo.

Ao mesmo tempo, a esquerda não pode permanecer como caudatária do desenvolvimentismo burguês. Isso aconteceu de forma clara depois da divulgação da Declaração de Março de 1958, do Partido Comunista Brasileiro (PCB).

Vale a pena estudar aquele documento. Ele é contraditório, mas extremamente interessante. O texto tem o mérito de produzir um giro na atuação partidária, que havia adotado concepções ultraesquerdistas, estreitas e sectárias após a publicação dos manifestos de janeiro de 1948, de agosto de 1950 e das resoluções do IV Congresso, de 1954. Todos representam reações à colocação do partido na ilegalidade, em 1947. O resultado foi o isolamento do PCB das forças nacionalistas e progressistas. Após o texto de 1958, a agremiação adotou uma linha de participação no movimento nacionalista, assumiu a luta democrática como bandeira e possibilitou a ela tocar as questões concretas do dia a dia. Houve uma busca pela concretização de alianças, sem exigências irreais, dogmáticas e apriorísticas de hegemonia, como acontecia no período anterior.

No entanto, a Declaração de Março tem como questão principal um grave erro estratégico, fruto de uma análise precária da composição de classes da sociedade brasileira. O texto atribui à "burguesia nacional" um papel progressista. A dada altura, a Declaração diz o seguinte:

O proletariado e a burguesia se aliam em torno do objetivo comum de lutar por um desenvolvimento independente e progressista contra o imperialismo norte-americano.

O resultado concreto foi que o Partido acabou por se colocar a reboque da "burguesia nacional" e de sua concepção política e econômica central, o nacional-desenvolvimentismo. A maior parte dessa burguesia aliou-se ao imperialismo no golpe de 1964, isolou e combateu os comunistas e a esquerda em geral.

O período nacional-desenvolvimentista não foi uniforme e suas características intrínsecas conheceram várias nuances. Obteve-se, através dessas orientações, um modelo de modernização acelerado, que não tocava nas estruturas arcaicas de concentração da renda e da propriedade.

Provocou um dos maiores deslocamentos humanos da história contemporânea, através das migrações internas do campo para a cidade, com vantagens e problemas daí advindos.

O desenvolvimentismo dos anos 1950 entrou em crise, no final daquela década, por conta da maciça e crescente necessidade de importação de bens de produção, o que passou a causar desequilíbrios estruturais no balanço de pagamentos. Some-se a isso, uma contradição inerente ao desenvolvimento, a formação de uma numerosa e disciplinada classe operária, que passou a reivindicar uma repartição maior das riquezas por ela produzida, colocando-se na prática contra um dos pilares do modelo, a superexploração do trabalho.

As raízes do golpe de 1964 estavam principalmente em impedir que as classes sociais emergentes na cena política a partir de 1930 - especialmente o operariado, os trabalhadores rurais e setores das camadas médias - exigissem democratização da propriedade, da renda e do poder político. Para seguir atraindo o capital externo, o país teria de domesticar as reivindicações trabalhistas e criar um ambiente politicamente estável.

O golpe de 1964 é a maior expressão histórica do equívoco de se submeter o movimento popular a uma diretriz própria da burguesia. O exame criterioso desse exemplo deve nortear as ações táticas e estratégicas da esquerda brasileira.

As vertentes da retomada

Após duas décadas de defensiva das camadas populares, a sociedade brasileira viveu novamente, a partir dos anos 1980, um intenso período de disputas, no bojo das lutas políticas pelo fim da ditadura. O debate tinha como pano de fundo a ofensiva do movimento popular.

A percepção de que o modelo anterior entrara em crise, gerando um acentuado desgaste político do regime suscitou um grande debate nacional. Ele combinava reivindicações democráticas com definições de rumos na economia. Havia três vertentes e várias nuances no tabuleiro.

A primeira delas, liderada pelo grande capital, clamava por uma política de desestatização, identificando o propalado gigantismo do Estado como matriz da dinâmica recessiva e inflacionária que o país viveu a partir de 1982. A saída seria uma redução do papel do Estado, para liberar energias produtivas da iniciativa privada.

A segunda era vocalizada por setores da burguesia - cuja tradução política se dava através da maioria do PMDB - e por uma parte do movimento social, especialmente pelos setores nos quais o PCB tinha forte presença. Exigiam uma redefinição do papel do Estado, que deveria retomar suas características de planejador e impulsionador do desenvolvimento.

E a terceira vertente - formada pelas lideranças do chamado "novo sindicalismo", por egressos da luta armada dos anos 1960-70 e por facções progressistas da Igreja Católica - advogava, de maneira rudimentar, uma ruptura com o capitalismo, sem mediações com a burguesia brasileira. Eram os setores que convergiriam para a formação do Partido dos Trabalhadores. A agremiação nasceu e cresceu criticando a política de alianças de classe do PCB.

Ao longo dos anos, a segunda e a terceira vertente tiveram grande convergência. Ou seja, o PT paulatinamente passou a adotar a aliança de classes que renegara no passado. E ao conquistar o poder de Estado, aconteceu o que o economista Paul Singer notou em entrevista recente: A "aliança com sistema financeiro e latifúndio deu ao PT tranqüilidade para governar".

Concretizou-se assim o pacto de desenvolvimento mencionado no início. Uma conformação política dessa natureza não é feita para se lutar pelo socialismo e muito menos para mudar estruturalmente a sociedade. É neste cenário que o grande capital, o agronegócio exportador e as velhas oligarquias seguem dominando, em aliança com parcelas expressivas do movimento popular.

Colocar na agenda

É também neste cenário que a esquerda socialista precisa alcançar legitimidade para colocar na agenda política a alternativa de uma transformação social radical. Dois erros devem ser evitados:

A)Ficar a reboque do desenvolvimentismo. Os setores que o compõem são aliados em uma luta comum até determinado ponto: romper com alguns constrangimentos impostos pelo capital financeiro, o que não é pouca coisa;

B) O segundo equívoco é o oposto. Seria incorrer num doutrinarismo estéril, sem disputar a base social do pacto dominante, que envolve setores com várias contradições entre si. Seria ao mesmo tempo incorreto eleger o desenvolvimentismo como obstáculo principal da luta pelo socialismo

No plano concreto, um programa tático poderia envolver, entre outros, os seguintes pontos:

A) Uma política monetária e uma política fiscal expansiva, que se traduza na quebra da dominação neoliberal. Concretamente isso se traduz em juros baixos, fim do superávit primário e na adoção de controle de capitais;

B) No âmbito do trabalho, redução de jornada, aumento de direitos e do trabalho formal;

C) Maior controle do sistema financeiro e reestatização das empresas privatizadas nos últimos 20 anos;

D) Aumento do investimento estatal nos serviços públicos

E) Auditoria da dívida pública;

F) Democratização das comunicações;

G) Reforma agrária;

H) Direitos iguais para homens, mulheres, negros e minorias;

I) Uma política de desenvolvimento ecologicamente sustentável.

A partir desses pontos - que contam com a concordância de amplas parcelas do campo popular, algumas hegemonizadas pelo pacto dominante - é que se pode avançar no plano concreto para a construção de uma estratégia socialista com força social.

A luta pelo socialismo é um projeto coletivo e não-linear. Depende das injunções históricas, do ambiente interno ao país, das condições da economia mundial e de decisões na esfera política. Ela necessita da constituição de uma frente popular e democrática, a partir das organizações existentes na sociedade. Pressupõe a disputa das bases sociais do pacto dominante.

A luta pelo socialismo não interessa ao grande capital e nem àqueles que têm no terreno financeiro e na especulação a fonte principal de seus ganhos. Um projeto desse tipo, que passa por uma ruptura revolucionária, pressupõe a supremacia da política, com sociedade organizada, instituições democráticas e Estado e forte. E pela solidificação dos partidos de esquerda.

É algo a favor das maiorias e contra as minorias privilegiadas. Um projeto desse tipo só é possível em um embate antiimperial de envergadura e de integração regional soberana. 

(*) Gilberto Maringoni é historiador
Artigo publicado na revista "Margem Esquerda", nº 17.

FONTE: Revista FORUM

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Hegemonia política do capital

Por Aluizio Moreira


No inicio de dezembro postei um comentário sobre a questão do partido revolucionário versus prática revolucionária. Naquela oportunidade, afirmei que não há como um partido comunista, ou se preferirem, um partido operário,submetendo-se às regras do jogo parlamentar burguês pela imposição do capital, promover uma transformação da sociedade no sentido do socialismo.

A chamada “governabilidade” não é simples retórica. Ela faz parte de um sistema de acordos, de alianças, mesmo conjunturais, sem os quais os parlamentares boicotam quaisquer pretensões emanadas do governo,  que se contraponham, de alguma forma, aos interesses da classe dominante, incrustada ou não no poder.

Por mais comprometido que seja determinado partido com as causas populares, que tenha como objetivo programático a instituição de uma sociedade para além do capital, as conquistas que ocasionalmente ocorram, não passarão de reformas nos limites aceitáveis pelo sistema.

Assim, abandona-se a defesa de uma reforma agrária (se faz assentamentos), não se investe no ensino público (colabora-se para  sua comercialização), não se melhora o sistema público de saúde (incentiva-se os planos privados de assistência médica), não se assume uma política de defesa do meio ambiente (entrega-se a particulares a “tarefa” de destruir rios e florestas). E quando, por exemplo, o governo reduz os preços dos produtos industrializados, não o motiva beneficiar a população com o preço baixo,  procura-se prioritariamente  evitar um colapso nas empresas. Passada a ameaça de crise, tudo volta ao que era antes.

Mas , sob quais condições a classe trabalhadora logrou participar do parlamento burguês?

É o que nos esclarece  István Mészáros (Atualidade histórica da ofensiva socialista, p.34-35): 
         O surgimento da classe operária na cena histórica foi apenas um acréscimo inconveniente ao sistema parlamentar, constituído bem antes de as primeiras forças organizadas do movimento operário tentarem manifestar em público os interesses vitais de sua classe. Do ponto de vista do capital, a resposta imediata a esse inconveniente mas  crescente “incômodo”, foi a rejeição e a exclusão dos grupos políticos operários. Mais tarde, entretanto, uma ideia muito mais adaptável foi instituída pelas personificações políticas mais ágeis do capital: domesticar de algum modo as forças do trabalho. Ela assumiu de início a forma do patrocínio parlamentar paternalista de algumas demandas da classe trabalhadora por partidos políticos burgueses relativamente progressistas e, mais tarde, a da aceitação da legitimidade dos partidos da classe trabalhadora no próprio Parlamento, embora, é claro de uma maneira estritamente circunscrita, obrigando-os a se conformar às regras democráticas do jogo parlamentar.   
Poderia ser de outra forma? Evidente que não. É a lógica do capital. Capital que “direta ou indiretamente" [. . .] "controla tudo inclusive o processo legislativo parlamentar, ainda que se suponha que este seja considerado totalmente independente do capital em muitas teorias que hipostasiam a “igualdade democrática” de todas as forças políticas que participam do processo legislativo". (Id. Ib. p. 36)

Compreender isso é de uma importância fundamental para quem quer mudar o mundo.

FOURIER, Charles

François-Marie Charles Fourier nasceu na província de Franco-Condado, na cidade de Besançon em abril de 1772, filho de um comerciante de classe média. Seu pai o orientara para seguir a carreira comercial, mas Fourier começou a ganhar a vida como empregado de uma oficina. 

Aos 17 anos ingressou numa casa comercial como balconista. Posteriormente, como caixeiro viajante, percorreu a França e a Europa fixando-se em Lyon.

Em 1793, época da fase do Terror na França, foi preso e recrutado para a infantaria, fato que o fez alimentar um grande ódio à Revolução francesa.

Para Fourier a humanidade conheceu as seguintes fases:
1 - o estado da natureza, época de liberdade e de igualdade social; 
2 - selvageria, fase em que surgiu os primeiros conflitos entre os homens; 
3 - patriarcado, época de dominação dos mais fortes elevados à condição de chefes de familia.
      Nessa fase se introduziu a propriedade privada; 
4 - barbárie, correspondente à Idade Média; 
5 - civilização, época de anarquia econômica, especulação, empobrecimento de um setor social; 
6 - garantismo, época de transição entre o individualismo e o socialismo; 
7 - socientismo, última fase em que a sociedade se organizaria em falanstérios, onde reinaria a
      harmonia e a felicidade entre os homens.

Critico e adversário ferrenho do capitalismo e da industrialização, elaborou um modelo de sociedade (O Estado Societário), baseada na associação e no cooperativismo, que seria organizada em falanges, integradas cada uma por 1800 pessoas que viveriam comunitariamente. Cada falange dedicar-se-ia a uma atividade "industrial": falange do trabalho comercial, falange do trabalho fabril, falange do trabalho agrícola, falange do trabalho doméstico, etc. Para construir tal sociedade, as pessoas de fortuna (empresários, homens da corte), deveriam investir capital monetário na edificação de um novo mundo. 

Para Fourier o trabalho deveria ser para o indivíduo uma atividade agradável e atraente. As famílias deveriam viver reunidas em sociedades que satisfizessem as necessidades, as inclinações e a natureza individuais.

Acreditava que a satisfação das necessidades dos homens teria condições de ser alcançadas em pequenas comunidades. Não aceitava a igualdade completa, pois de acordo com a própria natureza humana, segundo Fourier, os homens não eram iguais entre si. Consequentemente a redistribuição dos bens se daria de acordo com o trabalho e as necessidades de cada um.

Seu pensamento difundiu-se fora da França, pela Grã-Bretanha e Estados Unidos. Na França e Estados Unidos, os seguidores de Fourier chegaram a fundar cerca de 29 comunidades falansterianas.

Escreveu as seguintes obras: "Théorie des Quatre Mouvements et destinées générales" (1808), "Traité de l’association domestique-agricole” (1822), "L' Unité Universelle" (1822), "Le Nouveau Monde Industriel et Sociétaire"(1829), "La Fausse Industrie"(1835/36). 

Charles Fourier faleceu em Paris em outubro de 1837.


(Dados compilados por Aluizio Moreira)

Fontes:
Arquivo Marxista na Internet
BEER, Max. História do socialismo e das lutas sociais.São Paulo:Expressão Popular,2006.
BRAVO, Gian Mario. Historia do socialismo. Lisboa:Europa-America, 1977, 3 vols.
COLE, G.D.H. Historia del pensamiento socialista.Mexico:Fondo de Cultura, 1957-1960, 7 vols.
DROZ, Jacques (Dir). Historia geral do socialismo. Lisboa: Horizonte, 1972-1977, 9 vols.
HOFMANN, Werner. A historia do pensamento do movimento social dos séculos 19 e 20. Rio de Janeiro:Tempo Brasileiro, 1984.
PETITFILS, Jean-Christian. Os socialistas utópicos. São Paulo: Circulo do Livro, s/d.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

13º Encontro Internacional de Partidos Comunistas e Operários

De 9 a 11 de dezembro realizou-se em Atenas, sob a coordenação do Partido Comunista da Grecia (KKK), o  13º Encontro Internacional dos Partidos Comunistas e Operários. 

Sob o tema “O Socialismo é o futuro”, reuniram-se cerca de 80 Partidos Comunistas e Operários, que discutiram: a situação internacional de crise do capitalismo;  a experiência dos comunistas 20 anos depois da desagregação da União Soviética; as tarefas para o desenvolvimento da luta de classes nas atuais condições de crise capitalista; os recentes levantes e lutas populares; o fortalecimento do internacionalismo proletário; a formação de uma frente antiimperialista; a derrocada do capitalismo e a construção do socialismo. 

Estiveram presentes ao Encontro representantes do Partido Comunista Brasileiro (PCB) e do Partido Comunista do Brasil (PC do B).

Este Encontro Internacional dos Partidos Comunistas e Operários vem se realizando anualmente na Grécia desde 1999. A partir de 2006 passou a acontecer outros países como Portugal (2006), Brasil (2008), India (2009) e Africa do Sul (2010).

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Socialdemocracia precisa romper com liberalismo

Em entrevista, Benoït Hamon, líder da corrente mais radical do Partido Socialista francês, faz uma síntese dos estragos do livre comércio liberal sem freio e, sobretudo, da forma pela qual a esquerda renunciou a seus valores históricos e passou a colaborar com o mercado. “Recuperemos a marcha do progresso social” é a consigna do livro que Benoït Hamon acaba de publicar, "Tourner la Page" (Virar a página), cujo eixo é a ideia de deixar para trás os anos nos quais a socialdemocracia foi aliada do liberalismo.

Por Eduardo Febbro - Correspondente da Carta Maior em Paris

Não há nada melhor que uma travessia pela verdade e pela responsabilidade para entender o colapso mundial que desembocou na crise atual e a parte de responsabilidade que toca à esquerda europeia neste desastre. Benoït Hamon oferece esse duplo componente. Este dirigente socialista da nova geração, hoje porta-voz do PS, líder da corrente mais radical do Partido Socialista francês, fez uma síntese lúcida e responsável não só dos estragos do livre comércio liberal sem freio mas, sobretudo, da forma pela qual a esquerda renunciou a seus valores históricos e passou a colaborar com o mercado.

 “Recuperemos a marcha do progresso social” é a consigna do livro que Benoït Hamon acaba de publicar, Tourner la Page (Virar a página), cujo eixo é precisamente a ideia de deixar para trás os anos nos quais a socialdemocracia foi aliada do liberalismo para passar a construir agora uma outra sociedade.

Benoït Hamon constata o abismo onde os mercados financeiros lançaram a humanidade, a forma pela qual o neoliberalismo paralisa o progresso social, o consenso que impera nas elites para que sejam os povos que paguem a conta e a maneira pela qual se questiona o sufrágio universal em benefício de uma tecnocracia impune. Tourner la Page é uma espécie de mapa do caminho, uma estratégia para a recuperação do progresso social e, sobretudo, uma lúcida radiografia da socialdemocracia e seus anos de estreita colaboração com seu inimigo histórico. Frente a uma ideologia baseada na depredação, o socialismo não foi capaz de defender suas próprias alternativas. Hoje, defende Benoït Hamon, chegou a hora de romper o consenso e sair de um sistema econômico, social e monetário que só traz pobreza, destrói empregos e extrai do presente as conquistas sociais obtidas ao longo de décadas de luta.

Você aponta em seu livro uma das novidades mais emblemáticas da crise atual: a perda da soberania dos povos. Como vimos na Grécia e Itália e por meio das declarações da União Europeia e da chanceler alemã Ângela Merkel, o liberalismo tem medo do voto, ou seja, da coluna vertebral da democracia.

Durante muito tempo o liberalismo viveu mediante um compromisso firmado entre os liberais e os socialdemocratas. No entanto, quando se passou para uma nova fase isso mudou. Quando o livre comércio inaugurou outro ciclo e se produziu uma autêntica globalização da economia com medidas para a derrubada das barreiras tarifárias ou com mudanças como o fato da internacionalização da mão de obra, o capitalismo modificou sua posição.

Em primeiro lugar, ao capital já não interessa mais chegar a um compromisso com o trabalho, mas sim, ao invés disso, romper com ele para obter o máximo de lucros. No antagonismo entre os socialdemocratas e liberais o que hoje está claro é que, para os liberais, o sufrágio universal é um obstáculo à ideia que fazem de um mundo perfeito, sem travas, governado pelos mercados e no qual os instrumentos de regulação devem estar nas mãos de agências independentes, supervisores supranacionais e aparatos tecnocráticos. Os liberais recusam a supervisão política porque têm a íntima convicção de que o sufrágio universal é a ditadura do fraco sobre os fortes, a ditadura dos indigentes cujas condições de vida não permitem entender a complexidade das coisas.

Entre as elites, liberais ou não, persiste a ideia de que elas detêm um saber que as pessoas comuns não têm. Eu estou convencido de que é preciso agir de uma forma radicalmente oposta. Devemos recuperar as bases e os fundamentos da democracia nas sociedades ocidentais e europeias. Esses fundamentos estão hoje amplamente ameaçados por 30 anos de liberalismo. Observe o que ocorre na Europa onde se fala de transferência da soberania. De acordo, transfiramos a soberania da nação para a Europa, mas somente se essa transferência de soberania de uma instância democrática a outra instância democrática não mude meu poder. Aceito que a Europa reivindique a gestão de matérias que a nação não pode administrar com eficácia, mas, uma vez mais, somente quando meu voto e meu poder não sejam menos importantes que antes.

Hoje há um movimento forte nesta direção. O presidente francês e a chanceler alemã defendem que prerrogativas nacionais muito importantes sejam colocadas nas mãos da Europa.

De fato, entre outras coisas estão defendendo a ideia de submeter os orçamentos dos Estados europeus a um regime de sanções decididas por uma instância tecnocrática como a Comissão Europeia ou a Corte de Justiça Europeia. Não. Se eu decido que em meu orçamento nacional haja 10 bilhões de dólares destinados a educação, porque meu povo necessita disso, e depois vem a Corte de Justiça Europeia dizer-me que não, isso é um absurdo. Isso quer dizer que o legislador nacional que tem a legitimidade de seu povo deve modificar seu orçamento para respeitar um critério fixado por outros. Não. Isso não faz nenhum sentido. Estamos nesta situação e creio que é a principal ameaça que paira sobre as sociedades europeias.

Por acaso, o liberalismo não perdeu o medo da revolução, quer dizer, do povo?

Neste momento, na Europa, estão se plasmando características revolucionárias: crise econômica, desconexão das elites, enriquecimento dos mais ricos, sentimento de uma espécie de fatalidade segundo a qual existe só uma política possível que se traduz em mais esforços para as classes médias e populares, corrupção das elites e um clima contrário às mesmas. Tudo isso cria um contexto muito favorável para a extrema direita. Para a esquerda, não há nada pior que o debate se concentre entre, por um lado, a direita defensora da perpetuação do sistema e, do outro, a extrema direita que aparece como a única capaz de encarnar a transformação do sistema.

A esquerda aparece neste contexto como uma mescla de tudo, um pouco de sal, um pouco de azeite, um pouco de pimenta. Estou muito de acordo com o análise que faz o filósofo Slavoj Zizek quando diz que as diferenças entre a esquerda e a direita se resumem no essencial a questões de sociedade, mas questões sociais e econômicas aparecem como subtraídas do debate. Afinal de contas, as diferenças mais claras não aparecem entre os blocos esquerda/direita, mas sim entre a direita e aqueles que pretendem provocar um curto-circuito na construção europeia. A síntese é que, pouco a pouco, a socialdemocracia se dilui e desaparece da paisagem política.

Há uma lógica nisso: a socialdemocracia europeia se aliou com o capital e passou a fazer da arquitetura do mundo atual, e não como oposição, mas sim como sócia do modelo atual.

Foi isso que aconteceu. Mas a socialdemocracia é a grande perdedora deste pacto. A partir do momento em que o liberalismo econômico e o liberalismo político se impuseram, o acordo entre liberais e socialdemocratas tornou-se mortífero. Isso é o que está precipitando a queda da socialdemocracia europeia. A responsabilidade desta fase recai muito sobre os socialdemocratas alemães. Foram eles que, sob o impulso do ex-chanceler alemão Gerhard Schroeder, protagonizaram o giro liberal da socialdemocracia europeia através do pacto com o patronato, os sindicatos e os políticos para fazer baixar o custo da mão de obra. Com isso se criaram empregos mal pagos com o objetivo de ganhar competitividade. Logo depois houve a recusa dos socialdemocratas alemães de se aliar com a esquerda para formar o governo. O partido de Schroeder preferiu se aliar com a direita. O chefe do SPD me disse um dia: “esse acordo foi mortal, fomos o grandes perdedores. Nós morremos e eles prosperaram”.

Seu livro assume plenamente a responsabilidade da socialdemocracia nessa permutação da esquerda e seu conseguinte pacto ou acordo com os liberais. Mas, para você, chegou a hora de dizer basta.

Certamente. Por isso meu livro se chama “Tourner la Page”. Se queremos que as pessoas voltem a acreditar em nós, se queremos que nos escutem quando dizemos que este modelo de desenvolvimento é um modelo esgotado, que o modelo liberal fracassou, tudo isso passa pela vontade de virar a página e também, sobretudo, pelo reconhecimento de que nós estamos dentro dessa página que devemos virar. Quando fizermos isso, quando virarmos a página, deixaremos para trás uma página de nossa história marcada pela corresponsabilidade com o sistema atual.

Não creio que sejamos tão responsáveis como os conservadores ou os liberais, não. Nossa responsabilidade não é equivalente. Eles são hoje os arquitetos do desmantelamento do Estado Providência na Europa, coisa que não queremos. Isso, não obstante, não nos exime do fato de que, em um dado momento, fomos corresponsáveis. Acreditamos que podíamos construir um modelo com os liberais. Por conseguinte, os socialdemocratas europeus têm uma grande responsabilidade com a crise atual.

Para você, em que consiste exatamente virar a página? Qual é a direção?

Creio que hoje existem os meios de empreender uma política radicalmente distinta, no mínimo pelo fato de que hoje é possível evocar temas dos quais há dez anos não se podia falar. Sem dúvida, a rapidez da crise contribui para isso. Os temas centrais da transformação são os seguintes: o tema do livre comércio é essencial, ou seja, a necessidade de impor limites ao livre comércio, de regulá-lo. O segundo tema consiste em saber em que condições pode se financiar o Estado Providência, ou seja, a política tributária. Trata-se de saber de que meios se dispõe para financiar a educação, a saúde, os serviços públicos, a proteção social, a aposentadoria.

Evidentemente, o tema da política econômica e monetária é central. Sem uma política monetária e econômica constante não pode haver nenhuma mudança. É impossível dizer que se é de esquerda sem mudar a política fiscal, a política monetária, a política comercial e a doutrina da política econômica que hoje aposta no holocausto, ou seja, na competitividade por meio da diminuição do custo da mão de obra, ou seja, do trabalho.

Ninguém pode acreditar que pode ser mais competitivo em termos de custo da mão de obra que um operário chinês. É preciso mudar as três doutrinas: a doutrina monetária que aposta em um euro forte para controlar a inflação, a doutrina comercial ultra livre-comércio e a doutrina econômica que fundamenta o crescimento sob o baixo custo da mão de obra.

Ao menos na França, a dinâmica social que deveria impulsionar e acompanhar as mudanças parece ausente.

A dinâmica social existe, se estrutura, inclusive se as pessoas estão um pouco esgotadas pelos extensos movimentos sociais que ocorreram na França. A luta contra a reforma do sistema de aposentadorias foi longa e acabou derrotada. Ficou uma espécie de pedagogia negativa da luta social.

As pessoas se dizem: para que lutar se quase nunca ganhamos. Creio que se queremos sair dessa situação, se queremos recuperar a vontade política, se queremos deixar de ser tímidos diante dos bancos, se queremos deixar de ficar congelados perante às agências de classificação de risco, se queremos tudo isso devemos saturar o espaço social com nossas reivindicações.

Para virar a página não basta ter um projeto político. Mesmo quando se está no poder é preciso saturar o espaço social com as reivindicações. Aqueles que lutaram contra a direita quando ela estava no poder tem que entender que a luta recém começa quando a esquerda chega ao poder. É aí, quando a correlação de forças políticas está ao nosso favor que a força social tem que nos acompanhar. Neste sentido, penso que o recurso ao sufrágio universal e ao referendo é um meio para que o poder político legitime suas reformas.

Há uma espécie de limite no pensamento projetivo da socialdemocracia europeia. Sua capacidade de diagnóstico é brilhante, acertada, lúcida e até comovedora. Mas na hora de agir, a força não é equivalente. Por quê? Medo dos bancos? Temor ante o mundo financeiro?

Não é muito complicado: na França fazem falta quatro ou cinco leis para modificar radicalmente a natureza do laço entre os mercados financeiros e a economia real. Com uma lei sobre as transações financeiras, outra sobre a separação entre banco para atendimento do público e banco de negócios, outra sobre comissões bancárias, outra que aponte para uma reforma da aposentadoria fundado sobre o imposto ao capital, e uma outra lei tributária para que as renda pague tanto quanto os rendimentos obtidos mediante o trabalho, com esses textos já haveria uma mudança considerável. Não há nada de revolucionário nisso, tudo é autenticamente socialdemocrata. O senso comum deveria nos conduzir a isso. O assombroso é que, mediante o jogo dos lobbys, as redes e a pressão, as ameaças e os meios de comunicação, quando chega o momento de aplicar essas reformas tudo se torna muito mais complicado.

Você expressou várias vezes seu reconhecimento pelas mudanças que a socialdemocracia conseguiu fazer na América Latina, sobretudo no Brasil, Argentina e, em outro contexto ideológico, Venezuela.

O que me assombrou e interpelou na América Latina, e digo isso sem negar a dureza do combate, é o fato de que as coisas podem mudar. A correlação de forças que foi preciso enfrentar foi poderosa: Lula, Chávez, Evo Morales, Correa, Kirchner, todos enfrentaram essa situação. Não é fácil fazer política. Observo que, no que se refere a várias questões, por exemplo a mobilização de instrumentos econômicos independentes das instituições de Breton Woods, ou a questão das nacionalizações, ou da reapropriação das ferramentas de produção, em especial quando se trata de recursos naturais, em todas essas questões a América Latina demonstrou que, em uma economia globalizada, é possível reapropriar-se desses meios, redistribuir a riqueza, sem que isso arruíne um país. Na América Latina está a última juventude da esquerda mundial. Houve um momento em que essa posição esteve na esquerda europeia. Já não está mais. A esquerda latino-americana tem uma capacidade de questionar a ordem econômica mundial que a socialdemocracia europeia não tem mais.

Tradução: Katarina Peixoto

FONTE: CARTA MAIOR